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Janela Indiscreta
 
segunda-feira, março 31, 2003  
magnum bellum


©Ilkka Uimonen. IRAQ. Baghdad. March 28, 2003.


©Paolo Pellegrin. IRAQ. Fleeing Basra. 2003.

Iraqi Crisis: Latest Pictures. By Magnum Group


posted by Anónimo on 22:15


 
livros e o luar contra a cultura
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©Eve Arnold. USA. Hollywood. Joan Crawford. 1959.

Depois do belíssimo Vanina Vanini, foi com entusiasmo que li Ernestina, ou as 7 fases do amor, uma pequena história que Stendhal escreveu para demonstrar a sua teoria do amor.
Ernestina é uma jovem que os jogos do acaso empurram para um mundo novo e complicado onde as dúvidas, sobressaltos e cristalizações atacam e desorganizam o seu coração.
O livro é mais ou menos uma pequena ilustração do ensaio maior do escritor “Do Amor”, onde ele descrimina e analisa com detalhe (quase científico) as fases:
1ª – Admiração;
2ª – Que prazer, etc,:
3ª – A esperança;
4ª – O amor nasceu,
5ª – Primeira cristalização;
6ª – Aparece a dúvida;
7ª - Segunda cristalização.

A perspicácia de Stendhal é notável:
Finalmente, encontrou-se no seu pequeno quarto; tirou os ramos do seu lenço e, deixando para depois a leitura dos bilhetinhos, começou efusivamente a dar beijos nos ramos de flores, gesto que a fez corar quando se apercebeu do que estava a fazer. “Ah!, nunca mais vou mostar o meu ar imperioso, disse para si própria, vou emendar-me.”
Por fim, quando sentiu que já tinha manifestado toda a sua ternura àqueles ramos compostos das mais raras flores, leu os bilhetinhos. (Um homem teria começado por aí.) O primeiro, o que estava datado de domingo, às cinco horas, dizia:
“Neguei a mim próprio o prazer de vos ver, a seguir à cerimónia; eu não podia estar sozinho; tinha medo que se lesse nos meus olhos o amor em que ardo por si…”
Releu três vezes estas palavras, “o amor em que ardo por si”, depois levantou-se para ir ver no seu psyché se estava com um ar imperioso; e prosseguiu:
”… o amor em que ardo por si. Se o seu coração não está ainda comprometido, queira pegar neste bilhete, que poderia comprometer-nos.”


Como era bom que as raparigas trocassem o consultório sentimental da “Maria” pela graça e mestria do Stendhal, que mundo novo se abriria.

Ernestina ou as 7 fases do amor, Colares Editora

posted by Anónimo on 21:45


 
Far from Heaven



Todd Haynes é genial na reinvenção do melodrama. Far from Heaven conta duas histórias: uma à superfície feita segundo as regras de Douglas Sirk, a do casal magna-tech; a outra, mais profunda e mais real, em que as personagens se revelam desajustadas dos seus papéis. Em vez do marido fiel e profissional empenhado, encontramos um homem apaixonado por um rapaz, um homem cheio de dúvidas e remorsos. E por detrás da esposa extremosa, existe uma mulher em plena descoberta de si mesma e dos seus desejos.

O resultado é magnífico. Saí da sala com a sensação de ter visto o primeiro melodrama verdadeiro e isto é também um doce engano, porque o melodrama vive duma exarcebação de sentimentos que ultrapassa a realidade. Mas é um bom ponto de chegada: não será a ficção que hoje em dia nos devolve a imagem mais real da vida?

Neste filme tudo é perfeito. As cores são belas e outonais e entram em jogos subtis com o azul claro; a luz é coada. A música de Elmer Bernstein é sentimental. Os movimentos da câmara são suaves e os fundidos inebriantes. O guarda-roupa é excelente e minucioso: por exemplo, na última cena, Cathy troca os vestidos vaporosos por um tailleur justo e nós percebemos que toda a vida dela mudou, que a primavera não vai ser doce, que o final não vai ser feliz mas também que ela vai, pela primeira vez, fazer o que quer.

Os actores são sublimes e a Julianne Moore é bela. Acho que não vale a pena esgotar os adjectivos. A ver, mais do que uma vez.



posted by Anónimo on 21:18


 
A Viagem de Chihiro - se puderem, vejam :)
"For the people who used to be 10 years old,
and the people who are going to be 10 years old."
- Hayao Miyazaki


"Sen to Chihiro no Kamikakushi is a fantasy adventure with a ten year-old girl, which starts in everyday Japan but goes somewhere very different. For young Chihiro and her family, a mysterious tunnel and haunted town lead to the Land of Spirits, inhabited by gods and monsters and ruled by the greedy witch Yu-baba. Chihiro's parents are transformed into pigs; to rescue them, she must surrender her name and serve in this world. Luckily she finds friends and allies, including the handsome but mysterious boy Haku. Initially sulky and listless, Chihiro (or Sen, as she's now called) finds inner strengths and establishes an identity in this strange world. But can she win back her name and return home?” - © The Hayao Miyazaki Web

posted by camponesa pragmática on 11:10


domingo, março 30, 2003  

sob escuta
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Saiu com o Público de ontem mas ainda se encontra nos quiosques. De Monteverdi a Vivaldi, o cd gravado na Festa da Música que reune obras de Arcangelo Corelli, Antonio Vivaldi, Domenico Scarlatti, Claudio Monteverdi, Andrea Falconieri, Giovanni Battista Pergolesi, Carlo Gesualdo, Domenico Sarri e Benedetto Marcello. A presença portuguesa é assegurada pela Ana Mafalda Castro que interpreta a Sonata em Fá menor K. 239, de Scarlatti.

Excelente preparação para os concertos de 25, 26 e 27 de Abril no Centro Cultural de Belém.


posted by Anónimo on 19:14


 
"com ruas tão estreitas, não espanta que se tenham apaixonado o Simão e a Teresa"





Já ninguém sabe quem é o Simão ou a Teresa. O Amor de Perdição não está no programa e Jorge Silva Melo ficou triste e nostálgico.
A cultura popular que no romance teve o seu apogeu - e depois num cinema que já não há - esplendor burguês, nacional e libertário vai-se rio abaixo com a gente da minha meia-idade. Ou já foi antes, afogada pelos pais destes, gente com os meus anos, que calaram, pois confiaram na escola e ninguém conversou, ficou tudo a olhar para a televisão, Cornélias e Astros, nem os avós nem ninguém disse (confiem no Hermano Saraiva, confiem!) que Viseu, para além dos enchidos, é onde nasce a história arrebatada daqueles adolescentes tão próximos de mim, pelo menos de mim.

Nada disto tem, na verdade, importância, os tempos mudam, até vivemos melhor, e os corpos estão ainda mais belos neste princípio de Primavera. Mas eu fiquei triste por ninguém já saber do Simão Botelho.


Bela crónica, sim senhor. Eu também gosto do “Amor de Perdição (e de muitos outros livros do Camilo) e de arroz de grelos.

posted by Anónimo on 18:29


sábado, março 29, 2003  

The Office



Não percam a última hípotese de ver uma das melhores séries de humor em rodagem. Logo na rtp2 por volta da meia-noite.

The Office


posted by Anónimo on 22:42


 
28 dias depois



Uma tarde de chuva, com futebol (de alto gabarito, diria um jornalista desportivo), à porta de casa só podia dar nisto: ou me empanturava de chá e livros (e blogs), ou ia ao cinema. Fui ao Terço (literalmente, com muita fé), ver o último filme do Danny Boyle que me escapou no Fantasporto.
28 dias depois é um pesadelo. “Há qualquer coisa no sangue” diz Selena, uma das personagens. É um vírus que enraivece as pessoas e se espalha a um ritmo exponencial. Os familiares e vizinhos tornam-se nossos inimigos, para sobreviver temos de rever toda a nossa moral e ética. Não gostei das respostas que o filme vai dando, prefiro ficar com as minhas dúvidas. O que mais me impressionou foi encontrar as cidades intactas e as pessoas mortas, sim este pesadelo é pior que o meu, das ondas gigantes.
O filme descamba um bocado nas cenas em que os militares tentam recrear o mundo desde o Adão e Eva. Boyle contrapõe os seus comportamentos brutais com as belas esculturas clássicas que adornam a casa. Já são mensagens e morais a mais.

E agora um espaço publicitário: o Terço (que é uma sala muito fixe e barata) promete bons filmes para Abril:
de 4 a 10 > Chicago, vi a apresentação e passo mas para quem gostar de ver filmes oscarizados…
de 11 a 17 > Gangs de Nova York, parece estrondoso, nem vou ler as críticas, vou esperar para ver.
de 18 a 24 > Inadaptado, o Spike Jonze é um ilusionista, não vou perder

posted by Anónimo on 22:22


 

Uma Nova Geração de Poetas

Hoje "Mil Folhas" dedica três páginas à poesia, mais precisamente à poesia da nova geração.
É verdade que a poesia está em alta. As editoras publicam mais poesia. "Quasi" é uma editora que, divulgadora de muitos títulos de poesia nestes últimos tempos, cresce. Sim, os jornais e as revistas dedicam "dossiers". Dedicam. Mas onde estão realmente as revistas e os jornais de poesia? Lembro-me da revista "Relâmpago", "Inimigo Rumor", "Hablar/Falar de Poesia" e muito menos .
Para mim, a "Colóquio Letras" continua a ser a minha favorita
Há várias opiniões de críticos e nomes são destacados.
Partilho da mesma opinião de Gastão Cruz quando diz:
"[Gastão Cruz crê] que se está a "descurar o esforço de transfiguração do quotidiano através da linguagem", em prol de uma abordagem "mais imediata, que não recua perante a pequena crónica do centro comercial, do bar ou do supermercado" e que não oferece a possibilidade de "uma leitura menos literal".
Mais adiante Gastão Cruz sublinha:
"Não podemos esquecer que alguns dos poetas que asseguraram a melhor produção desta década são de gerações anteriores, como Pedro Tamen, Fiama, Armando Silva Carvalho e Franco Alexandre, ou ainda Ramos Rosa e Eugénio de Andrade, que mantêm o seu alto nível."
O artigo longamente opinativo vem acompanhado por poemas e fotografias de Duarte Belo.
O primeiro poema pertence ao poeta Carlos Saraiva Pinto que é a revelação mais interresante do volume "Anos 90 e Agora", de Jorge Reis-Sá, segundo a crítica Rosa Maria Martelo.
Aqui fica o último poema do seu livro "Escrever Foi Um Engano" (2001).

a Pasolini

Sabes que eu
podia ter terminado
como o outro em óstia.

não porque tivesse um amante proletário violento
mas porque me opus a um lado e a outro
da conspurcação.

portanto leitor nunca te esqueças disso
nem da minha mente
tingida pelo sangue da adrenalina
do tempo furioso.

levantava-se um vento forte
em óstia semanas antes,
disse-me uma testemunha.
o mesmo vento áspero
que me faz hoje aquecer as mãos
com o bafo da minha boca
numa interminável
fila de refugiados entre a albânia e a grécia.

lembra-te pois disso leitor
e dá-me paz.

Carlos Saraiva Pinto


posted by Anónimo on 19:47


 

Não se é duquesa
A cem metros de uma carruagem.


Pretexto para um convite para a exposição Portraits by Henri Cartier-Bresson, inaugurada agora mesmo no boogie woogie. Lamentamos mas não há nem croquetes nem copos, só mesmo retratos.


posted by Anónimo on 17:01


 
What do we know but that we face
One another in this place?

W.B.Yeats


É assim que se apresenta o Timewatching, o blog da Carla Milhazes que fala de livros, de filmes, e do mundo. Que observa e reflete. Roubo as tuas palavras e HOJE ACONSELHO uma ida ao timewatching. Podes contar com mais um rosto incógnito.

posted by Anónimo on 16:30


 
Enquanto viva o português, o galego não morrerá

O Filipe Bret reincide na Galiza. Desta vez com um poema de Celso Emilio Ferreiro e a cumplicidade de Carlos Drummond de Andrade. Volta sempre!

Fiquei muito satisfeito por saber que vários leitores da Janela Indiscreta gostam e se interessam pela poesia galega. O seguinte poema é de um dos meus poetas galegos preferidos, Celso Emilio Ferreiro (Celanova 1912 - Vigo 1979) e foi escrito quando foi condenado à morte pelo regime franquista, durante os quatro dias que passou na prisão até a sua familia ter conseguido o indulto.

Longa noite de pedra

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Carlos Drummond de Andrade

O teito é de pedra.
De pedra son os muros
i as tebras.
De pedra o chan
i as reixas.
As portas,
as cadeas,
o aire,
as fenestras,
as olladas,
son de pedra.
Os corazós dos homes
que ao lonxe espreitan,
feitos están
tamén
de pedra.
I eu, morrendo
nesta longa noite
de pedra.

Celso Emilio Ferreiro (do livro Longa noite de pedra; Editorial: Edicións Xerais de Galicia, Vigo, Galiza)

Infelizmente o galego (português da Galiza ou galego-português) é uma lingua que tem sofrido imenso, tendo vindo a sofrer um processo de espanholização crescente. É muito triste assistir à passividade das autoridades portuguesas no que se refere ao presente e futuro da lusofonia europeia (Galiza e Portugal). Parece que os nossos governantes desconhecem que o galego e o português sempre foram a mesma língua, desde as suas origens no território da Gallaecia ("Na cidade galaico-romana de Bracara Augusta, hoje Braga, apareceu já há bem tempo uma inscrição dedicada a um neto do imperador Augusto. Nela surge à luz, pela primeira vez, o nome de Gallaecia. É a sua primeira aparição histórica documentada. Não é possível conhecer a data exata dessa inscrição, que pode ir desde o ano 5 antes de Cristo até o 4 depois de Cristo. Alguns dados fazem mais provável o ano 3 antes de C." ("O Feito Diferencial Galego na Historia") até a sua diversidade actual por vários continentes. A Constituição da República Portuguesa diz, na alínea f) do Artigo 9º: ‘São tarefas fundamentais do Estado (...) assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa’. O que tem feito o estado Português nesse espaço lusófono que é a Galiza? NADA.
Quero recordar o episódio em que o Presidente da República, Jorge Sampaio, durante uma visita que fez a Santiago de Compostela se recusou a falar com um grupo de galegos que defendem a unidade linguística, fazendo o mesmo num simpósio que se realizou na Anadia.
Sobre a falta de difusão de livros e jornais portugueses na Galiza o Instituto Camões em Vigo e o seu presidente em Lisboa quando confrontados com o problema pelo Semanário Transmontano não fazem comentários. Deve ser que estão orgulhosos do seu trabalho.

Para terminar, gostaria de mencionar Carlos Drummond de Andrade:

"Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo.
E saúdo velhos amigos."


posted by Anónimo on 15:30


sexta-feira, março 28, 2003  
A Leste

Enormes troncos de árvores em tamanho natural, ramos despidos a baterem na clarabóia; uma sala forrada de panos brancos, um tecto falso a abater-se sobre o espectador; restos do Outono num canto das escadas. O Leste espalhou-se, vai espalhar-se pelos cinco andares da Casa d'Os Dias da Água, espaço, em Lisboa, da Sensurround, companhia de Lúcia Sigalho, que é ocupado também pela Cão Solteiro.
"Acho que os portugueses têm uma grande afinidade com os povos eslavos; há algo da alma portuguesa que se espelha, a nostalgia do ser humano", diz Lúcia Sigalho. "Se calhar nós temo-la pelo Atlântico, eles pela paisagem. E são culturas que viveram isoladas do resto do mundo e isoladas entre si".


Excelentes notícias! O artigo é de Joana Gorjão Henriques e está no Y

posted by Anónimo on 20:20


 

Ensaio de Alberto Pimenta "O Silêncio dos Poetas" volta às livrarias





O ensaio "O Silêncio dos Poetas", de Alberto Pimenta, esgotado em Portugal desde finais da década de 80, volta às livrarias numa nova edição que inclui dois novos estudos, com chancela da Cotovia.


Publicado em Portugal pela primeira vez em 1978 pela editora A Regra do Jogo, "O Silêncio dos Poetas" regressa agora com os estudos "Reflexões sobre a função da arte literária" e "A dimensão poética das línguas".

Para Alberto Pimenta, a unir estes dois novos textos entre si e ao livro antes editado está "uma ideia central, a de que a expressão estética exige uma apreensão estética".

A professora universitária italiana Carmen M. Radulet recorda que o ensaio de Alberto Pimenta "nasce através de uma reflexão complexa de carácter teórico, iniciada na Alemanha em fins dos anos 60, e aperfeiçoada depois durante um confronto a nível académico com os investigadores italianos".

É também esta docente quem sublinha o carácter provocador do poeta, que chegou a queimar o seu livro para o ver renascer agora, por ocasião do centenário do nascimento de Th. W. Adorno, teórico que lhe esteve e continua a estar mais próximo.

O livro é divulgado de norte a sul do país na primeira quinzena de Abril, mas pode ser já encontrado na livraria da Cotovia em Lisboa com 10% de desconto, numa iniciativa que visa ajudar ao relançamento deste espaço livreiro.

Alberto Pimenta nasceu em 1937 e entre os seus livros publicados desde 1970 destacam-se "O Labirintodonte", "Os Entes e os Contraentes", "Heterofonia", "A Visita do Papa", "Homilíada Joyce", "Read & Mad" e "As 4 Estações".

São também de sua autoria "The Rape", "Sex Shop Suey", "IV de Ouros", "Tomai Isto é o meu Porco", "A Divina Multi(co)média", "Santa Copla Carnal", "Obra Quase Incompleta" e "A magia que tira os pecados do mundo".



Agência LUSA



posted by Anónimo on 14:20


 

Noite de Teatro


Ontem fui ver Giovanna d’Arco Al Rogo (1954), de Roberto Rossellini, numa adaptação do oratório dramático (1938) de Paul Claudel, com música de Arthur Honegger.
O filme começa com uma representação das trevas: cerca de uma dezena ou duas de anjinhos que me pareceram de louça, suspensos num fundo negro, obscurecidos e velados por uma névoa retalhada. Os anjinhos surgem dispostos, primeiro, num braço de espiral, num desenho semelhante à mancha de estrelas da Via Láctea quando é fotografada a partir do Sistema Solar e a espiral só se adivinha; depois, numa espiral completa; e, por fim, em caracol – estas três perspectivas acontecem à medida que a objectiva se afasta das figuras. As figuras são suaves e apagadas, como se a cores pastel se acrescentasse, de alguma forma, o tom acastanhado, gasto e usado da sépia. Às figuras, estáticas, é conferido um andamento circular porque a objectiva se move em seu redor. Percebe-se que são anjos de louça mas, quer por essa petrificação, que inquieta, quer por ser muito difícil a percepção dos seus contornos e pormenores, é como fantasmas que surgem e os sentidos arrepiam-se, crédulos, contra todos os argumentos da razão. Isto, sob os cânticos sacros de Honegger, é muitíssimo impressionante. Na última e quarta perspectiva, celestial, a espiral de figuras é visível através de uma moldura de nuvens, branca, sépia e rosa, em primeiro plano (colocada mesmo à frente da objectiva?). Esta representação, antes do genérico, é uma pintura e é profundamente dramática.
Depois do genérico, começa o teatro. Na peça, Giovanna – Ingrid Bergman -, por todos condenada, vê, revê e por vezes participa, em espaços e tempos desencontrados, na companhia de Frei Dominique, da história da sua vida. Gostei especialmente do julgamento eclesiástico que a condenaria à fogueira, com o satírico quórum composto pelos mais acéfalos e desrespeitáveis animais domésticos: um porco, um burro e um séquito de ovelhas.
O filme, que também é teatro, não se confunde com teatro. Filma teatro, o que é diferente. Os actores, suas vozes e gestos são teatrais, o monólogo (há a presença de Frei Dominique, a quem ela dirige perguntas e do qual se afasta, por vezes, em revolta, mas, arrisco, poderia não estar lá ninguém e o efeito dramático seria o mesmo) de Giovanna é um texto de teatro, e há todo o dramatismo daí resultante.
Mas, a diferença é assombrosa. A expectativa do teatro ao vivo não está lá, nem poderia estar; a carga emocional extrema do teatro que acontece à nossa frente, em que a enésima vez dos actores é para nós, público, a primeira e última, a única irrepetível vez, não existe; nem o agora levantava-me e tocava-te, louca possibilidade que a auto-censura impede mas na qual a imaginação, absoluta liberdade do pensamento, se aninha e permanece. Por vezes desejei que este filme não fosse tão filme e que me fosse permitido assistir à peça de uma distância constante, sem que o palco se afastasse da minha cadeira.
Eu trato mesmo muito mal o cinema. Ou lhe peço fotografias ou lhe peço teatro. Agora mesmo, enquanto corria a internet em busca de uma imagem do filme, essa pintura maravilhosa, acabei por escolher uma fotografia a preto-e-branco... com grão e tudo, como resistir?



posted by camponesa pragmática on 13:37


 



Alphaville mistura cinema negro (Eddie Constantine e a sua pistola estão lá para o provar), com ficção cientifica, pernas de raparigas bonitas, semântica e poemas de Paul Éluard. O resultado poderia ser estranho mas a frescura do Godard dos anos 60 consegue a proeza de dar coesão ao filme e, ainda por cima, fazê-lo com graça.

Alphaville vive sob um regime totalitário nem de direita nem esquerda (digamos que reune características das duas e ainda lhe junta uma vertente semântico-neuronal), que despreza o presente, as emoções e as palavras. Lentamente, o léxico dos seus habitantes vai sendo reduzido e as suas vidas esvaziadas. Natacha faz um esforço para perceber as palavras de Paul Éluard na “Capital da Dor”.

A cidade é controlada por um supercomputador chamado Alpha 60 (interpretado por uma voz rouca), inventado pelo Dr. Von Braun (o pai da Natacha). Esta máquina é responsável pela “programação neurolinguística" que é uma espécie de lavagem ao cérebro que embrutece e aliena as pessoas. A máquina diz coisas deste tipo:

– In so called capitalism or communism, there is no such evil intention existing to oppress human through the use of power of ideology or materialism. Only natural intention of all organizations that seek to enlarge their own rational structure.
 
– Once we know the number one, we believe that we know the number two, because one plus one equals two. We forget that first we must know the meaning of plus.


Se quiserem podem ouvir a voz aqui aqui

O filme é todo ele muito recomendável mas destaco três cenas brilhantes:

Quando o Alpha 60 pergunta a Lémy Caution o que é que transforma a noite em dia ele responde: a poesia. É inesperada esta resposta, Lémy é um agente secreto e tem cara de ler apenas relatórios de serviço mas Godard baralha tudo e oferece-nos uma das melhores e mais líricas definições de poesia.

A coreografia das execuções. Os que vão morrer discursam (as palavras são o maior sintoma de liberdade em alphaville – e não só em alphaville... –) sobre uma prancha de piscina. As palavras deles são rebeldes e por isso são fuzilados. Os corpos caem na água e são recolhidos por uma ninfas aquáticas num bailado digno da Esther Williams.

E a última cena. Lémy Caution salva a rapariga e fogem juntos de Alphaville num carro (já não me lembro se é o ford galaxy do início). A custo, ela consegue dizer o que tem que dizer. É uma declaração de amor ou uma declaração de liberdade?

Ouvre tes ailes beau visage
Impose au monde d'être sage
Puisque nous devenons réels.

Paul Éluard


posted by Anónimo on 13:10


 
Serralves vai a Coimbra


© Atom Egoyan e Julião Sarmento: Close, 2000/2001

Inauguração: O melhor de Serralves em Coimbra

Uma selecção de obras da Fundação de Serralves, de artistas contemporâneos que recorrem à fotografia, ao cinema e ao vídeo, integra a exposição "Sem limites", a inaugurar hoje à noite no Centro de Artes Visuais (CAV), em Coimbra. A exposição apresenta um conjunto de obras de mais de três dezenas de artistas, portugueses e estrangeiros, que usam aquelas artes como suporte dos seus processos criativos, superando os limites de qualquer programa que os pretenda caracterizar e condicionar.
Dan Graham, David Lamelas, Pierre Huyghe, Edward Ruscha, Robert Smithson, Gerry Schum, Gilbert & George, Julião Sarmento, Fernando Calhau, Peter Hutchinson, Ângelo de Sousa, Helena Almeida, Augusto Alves da Silva, Dennis Oppenheim e Rui Toscano são alguns dos artistas representados na mostra, que estará patente até dia 27 de Abril.
A selecção, feita pelo director do Museu de Arte Contemporânea de Serralves e comissário da exposição, João Fernandes, permite apreciar obras do final dos anos 60 e início da década de 70, ilustrativas das tendências da época, de mudança de rumo na arte.

© Pedro Correia JN

posted by Anónimo on 13:08


quinta-feira, março 27, 2003  

O Teatro de
Sarah Kane


Não me lembro quando e onde li pela primeira vez o nome de Sarah Kane. Ernesto Sampaio e os Artistas Unidos são certamente os culpados.
Sarah Kane é daquelas autoras que necessita da parte do outro o saber descobrir.......................
(Parece que não mas o teatro pede muito de nós.)
As palavras de Edward Bond são acertadas.


"Há dois géneros de autores dramáticos. Os primeiros fazem jogos teatrais com a realidade. Alguns fazem-no mal, outros fazem-no bem, e neste caso as suas peças podem mesmo continuar a ser interessantes. Os autores do segundo género mudam a realidade. É o que fizeram os Gregos e Shakespeare. (...)
Sarah Kane era uma autora dramática do segundo género. O confronto com o implacável criava as suas peças. Terá ela sabido- terá o autor dentro dela sabido- que poderia deixar de ser capaz de o enfrentar nas suas peças? A nossa sociedade e o nosso teatro opõem-se. Devemos consumir para manter a economia, para manter a única via que nos damos ao trabalho de imaginar. Mas a necessidade de consumir não é o desejo de ser humano. Este desejo é a necessidade de enfrentar o implacável. É esta lógica da nossa situação. Se não o enfrentarmos para encontrar a nossa humanidade, é ele que nos enfrentará e destruirá. É esta a lógica do século XXI. (...)
Sarah kane tinha de enfrentar o implacável. Só podemos retardar o confronto se estivermos certos de que ele ocorrerá num dado momento. Senão ele esquivar-se-á. Tudo o que Sarah Kane fazia tinha autoridade. Se pensava que o confronto talvez não pudesse ocorrer no nosso teatro- porque está a perder a sua função de compreensão e os seus meios-não podia correr o risco de esperar. Em vez disso, representou-o noutro lugar. Os meios de enfrentar o implacável são a morte, a casa de banho e os atacadores de sapatos. São eles o comentário que ela tinha a fazer sobre a perda de sentido do nosso teatro, das nossas vidas e dos nossos falsos deuses. A sua morte é a primeira morte do séc XXI. "


Edward Bond


posted by Anónimo on 21:38


 

Centro Virtual Camões: Mapa.


posted by camponesa pragmática on 17:47


 

balança


No prato da balança um verso basta
para pesar no outro a minha vida.
- Eugénio de Andrade



posted by camponesa pragmática on 16:13


 

a poesia vai acabar
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«Há no mundo inteiro uma, quando muito, rua difícil de encontrar
- Metáfora Viagem: palavra do poeta.
», são palavras de Luíza Neto Jorge e servem de título à antologia organizada por Ana Castro e Jorge Roque, lançada este mês pelo IPLB para comemorar o Dia da Mundial da Poesia, no passado dia 21. Veio-me parar às mãos ontem, por acaso, e agora, se quiser mais, terei de ir ao Teatro Nacional Dª Maria II, onde consta que se distribui gratuitamente aos leitores. Se puder irei pois gostei muito do que vi e do que consegui ler. A antologia começa com “Flor”, de Almada Negreiros, escolha feliz, pois no dia 21 celebrou-se, além da poesia, o início da Primavera e o Dia da Árvore, e “Salto em altura V”, de Carlos de Oliveira faz o prólogo. Começa então a viagem, durante a qual encontramos Al Berto, Eugénio de Andrade, Luís de Camões e Sophia Andresen, entre outros. O epílogo é de Herberto Hélder, com “Redivivo: e basta a luz do mundo movida ao toque no interruptor”.


posted by camponesa pragmática on 16:07


 

Todas as salvagardas que nos merecemos.
O teu perfil confidente.
Como todo o que che digo cando non podes ouvirme
e é tan dura a tarde, e ti tanto me faltas.

Os nosos dáctilos Par a par.
Soños fértiles Par a par.
Parecía imposible que coubese tanto alento,
tan madrepérola como agora nos preña.
Veña, miña bela bestia, vén coa túa yolandalatría.

A tarde nos visita algunha vez abandonados
e tí dis corazón, esa palabra que odio.
Fuches ti, meu animal, fuches ti quen esculpiu
nas miñas nádegas un verso que dicía para sempre.

© YOLANDA CASTAÑO, "Vivimos no ciclo das erofanías" (1998)

O Filipe Bret mandou-nos este bonito poema.
Yolanda Cataña (Santiago de Compostela em 1977). Podem encontrar alguns dos seu poemas, no livro colectivo de 7 poetas Galegas "Mulher a facer vento", publicado por Ediçoes Tema (Lisboa) em Maio de 1998.

Obrigado Filipe!


posted by Anónimo on 13:15


 
Bring Back Monica Lewinsky

O escritor Phillip Roth propôs ao Milton Glaser o desenho de um autocolante. Não tem fotografias do presidente americano, nem fotomontagens, nem armas, nem pombas. É apenas uma frase, mas por mim já ganhou o Prémio Grande Sorriso.

Podem ler a história no Le Monde


posted by Anónimo on 11:30


 
Festa da música - Três dias para ouvir obras de Monteverdi a Verdi

Os cerca de 51 500 bilhetes para a 4º edição da Festa da Música estão disponíveis a partir de hoje. Aquela que se tornou uma das mais emblemáticas manifestações culturais tendo como base a música clássica decorrerá entre 25 e 27 do próximo mês, no Centro Cultural de Belém (CCB). Este ano, o mote da festa é De Monteverdi a Vivaldi, isto é dois séculos e meio de música barroca, num total de cerca de 80 compositores e engloba um conjunto de 135 concertos repartidos pelos três dias do evento.
Ao longo de três dias, o CCB irá transformar-se num espaço festivo e, a exemplo de edições anteriores, está preparado para receber dezenas de milhares de pessoas.
Os concertos decorrem em sete salas que foram rebaptizadas com outros tantos nomes, desta vez os de grandes mestres italianos da pintura.

© Ana Vitória Jornal de Notícias

posted by Anónimo on 09:27


 
Is the theatre still relevant to the times?

A Message on World Theatre Day 2003 

We keep asking the question: Is the theatre still relevant to the times? For two thousand years the theatre has held a mirror up to the world and explained our place in it. Tragedy has portrayed life as being subject to Fate -  Comedy has done this often enough as well. Human beings are flawed, we make fatal mistakes, rail against our circumstances, clutch at power, are weak. Deceitful and naïve, we are happy in our ignorance and sickened by God. I hear people say that life today is beyond the grasp of the traditional instruments of the theatre and that it is consequently no longer possible to tell stories. Instead, different sorts of texts, no dialogues, but rather statements. No drama. A new kind of human being is beginning to appear on our horizon: Beings that can be cloned and genetically manipulated according whim and plan. These new, flawless beings, insofar as they are possible, would have no need for the theatre as we understand it. They would be unable to comprehend the conflicts that drive it. But we don't know the future. I think it is up to us to devote all of the energies and the talents that have been given to us - by whom we do not know - to protect from this uncertain future our wicked, beautiful and imperfect present, our irrational dreams and fruitless exertions. The means at our disposal are rich. Theatre is an impure art and therein lies its vital power. Unscrupulously, it uses everything that stands in its way. It is forever betraying its own principles. It is, of course, not immune to the fashions of the times, it avails itself of images from other media, sometimes speaking slowly, sometimes quickly. It stammers and falls silent. It is extravagant and banal, evasive, destroys stories while creating new ones all the same. I am confident that the theatre will always be able to fill itself with life - as long as we feel the need to show each other what we are and what we are not and what we should be. Long live the theatre! The theatre is one of humanity's great inventions, equal to the discovery of the wheel and the taming of fire.

Tankred Dorst

posted by Anónimo on 09:13


quarta-feira, março 26, 2003  
«O cinema não tem que ser a preto e branco»



posted by Anónimo on 11:14


 

"Sonhos e conflitos" Bienal de arte de Veneza dedicada aos conflitos no Mundo


A 50.ª edição da Bienal de Veneza de arte contemporânea, de 15 de Junho a 2 de Novembro, terá por tema "Sonhos e conflitos: a ditadura do espectador", anunciou o seu director, Francesco Bonami. A mostra é um dos acontecimentos culturais com maior prestígio ede maior projecção no Mundo; procurará, este ano, aproximar a arte da realidade, retratando conflitos e crises mundiais.
Portugal estará representado por Pedro Cabrita Reis, ficando o pavilhão português instalado nos Antichi Granai, na ilha de Giudecca. Este pavilhão foi produzido e organizado pelo Instituto de Arte Contemporânea, sendo comissariado por Vicente Todoli e João Fernandes, através do Museu de Serralves.
Pela primeira vez, a mostra geral será composta por uma dezena de projectos com uma identidade e autonomia próprias, cada um deles confiado a um director diferente "de modo a ter em consideração a diversidade da realidade artística contemporânea", precisou Bonami.
A exposição decorrerá em vários locais da cidade dos Doges, nomeadamente nos Jardins da Bienal, no Arsenal e no Museu Correr, na Praça de São Marcos, e apresentará várias centenas de trabalhos de 64 países.
"A nossa época já não permite conceber um grande evento de arte contemporânea como um exercício puramente estético dissociado do mundo no qual vivemos", sustentou Bonami.


© JN Online

posted by Anónimo on 11:09


 

Fantasporto chega a Lisboa com os filmes premiados "Intact" e "L.I.E."


Os filmes que mais marcaram as últimas edições do Fantasporto estarão em Lisboa a partir de 15 de Abril, nas quatro salas do Cinema Quarteto, anunciou no Porto fonte da Cinema Novo, que organiza o festival.


Entre os filmes a passar no Quarteto, no âmbito da Maratona Fantasporto" estão o vencedor do Grande Prémio Semana dos Realizadores do Fantasporto 2003, "L.I.E." de Michael Cuesta, e o Grande Prémio Secção Oficial Cinema Fantástico da mesma edição, "Intacto" de Juan Carlos Fresnadillo.

A fonte da Cinema Novo referiu que a "Maratona Fantasporto" se perfila como um elo de ligação ao público cinéfilo da capital, dando a conhecer filmes que entrarão em breve no circuito de distribuição comercial português.

"Queremos também chamar a atenção do Governo e das autarquias locais para o facto que o Fantasporto assumir carácter nacional e não apenas local, como por vezes, pode erradamente parecer", referiu a mesma fonte.


Agência LUSA


posted by Anónimo on 11:05


 
Espectáculos gratuitos assinalam Dia Mundial do Teatro por todo o país



Estreias, leituras de peças e um "ultimatum" assinalam amanhã o Dia Mundial do Teatro, destacando-se uma conferência de Patrice Pavis no D. Maria II, em Lisboa, num dia de entrada gratuita nos espectáculos.


Célebre ensaísta, crítico de teatro e autor de obras de referência no campo da dramaturgia, Patrice Pavis profere, a partir das 17:00, no Teatro Nacional D. Maria II, a conferência "A Encenação: De onde vem? Para onde vai?", que conta com a presença do ministro da Cultura, Pedro Roseta.

O Nacional D. Maria II assinala ainda a efeméride com os espectáculos "O Caminho Solitário" e "Estudo para Ricardo III", e com a leitura da peça "Fazedor de Teatro", de Thomas Bernhard.

Na capital, destaca-se igualmente a leitura de "Lisístrata", no âmbito do "Lysistrata Project", um movimento contra a guerra no Iraque, pela companhia A Barraca, a partir das 21:30 no CineArte.

"Ultimatum ao Teatro Português", inspirado no "Ultimatum às Gerações do Futuro", de Almada Negreiros, é a iniciativa que o Teatro Municipal São Luiz preparou para amanhã, com a participação de personalidades ligadas a vários quadrantes da sociedade portuguesa.

Actores, críticos e políticos vão fazer depoimentos curtos, que serão retransmitidos num ecrã gigante situado no Largo do Chiado, entre as 19:00 e as 23:00.

O Teatro da Trindade comemora o Dia Mundial de Teatro com a estreia das peças "Proof", o espectáculo mais premiado de Londres e Nova Iorque, e "Posse", que fecha o "Ciclo Contemporâneos Portugueses".

Ainda em Lisboa, o Teatro Nacional Maria Matos optou por celebrar a data na Avenida de Roma com animação de rua até às 20:00, convidando as pessoas "a olhar para o teatro de perspectivas diferentes".

O Dia Mundial do Teatro será também assinalado em Guimarães, Portalegre, Faro, Coimbra, Azambuja, Montemor-o-Novo e Braga, num dia em que ir ao teatro é "à borla".


Agência LUSA


posted by Anónimo on 11:02


 


Sonhei com actores
num teatro, que quererá isto significar?
Um sonho a preto e branco (já não sonho a cores),
não sei que peça
se representava; eu (alguém)
era um espectador, pois via o palco:
parados, que se tivessem subitamente esquecido
do que deviam dizer,
olhando-me (se se tratava realmente de mim)
longamente e angustiadamente, à espera
que eu acordasse
e que o meu sonho- tinha que ser um sonho
de alguém, estavam certamente a sonhar,
iriam acordar e não passaria tudo de um sonho!-
terminasse.



Manuel António Pina
, Cuidados Intensivos, 1994.



posted by Anónimo on 00:15


terça-feira, março 25, 2003  
Descoberta da noite: Joseph Brodsky no 1bsk. Vou seguir o conselho, vou desligar o computador e vou para a cama ler.

posted by Anónimo on 23:41


 
Da Poesia Moderna

O poema da mente no acto de encontrar
Quanto baste. Nem sempre teve
Que encontrar: a cena estava montada; repetia o que
Estava no guião.
Então o teatro foi mudado
Para outra coisa. Seu passado era uma lembrança.
Ele tem que estar vivo, que aprender o discurso do sítio.
Tem que enfrentar os homens do tempo e encontrar-se com
As mulheres do tempo. Tem que pensar sobre a guerra
E tem que encontrar quanto baste. Tem
Que construir um novo palco. Tem que estar nesse palco
E, como um actor insaciável, vagarosamente e
Com meditação, dizer palavras que ao ouvido,
Ao mais delicado ouvido da mente, repitam,
Exactamente, o que ele quer ouvir, ao som
Das quais, uma audiência invisível escuta,
Não a peça, mas a si mesma, expressa
Numa emoção como de duas pessoas, como de duas
Emoções a tornarem-se numa. O actor é
Um metafísico no escuro, tangendo
Um instrumento, tangendo uma corda de metal que dá
Sons a passarem por súbitas exactidões, na totalidade
A conter a mente, abaixo da qual não pode descer,
Além da qual não quer elevar-se.
Deve
Ser o encontar uma satisfação, e pode
Ser de um homem patinando, uma mulher dançando, uma mulher
Penteando-se. O poema do acto da mente.

Wallace Stevens
Para quem preferir o original


©Josef Koudelka. Prague. Play: The Three Sisters. 1966.

posted by Anónimo on 23:10


 
de Georg Büchner, Leôncio e Lena

Leôncio – Vês, Lena, estás a ver como temos os bolsos cheios, cheios de bonecos e brinquedos? Que havemos de fazer com eles? Pintar-lhes uns bigodes e pôr-lhes sabres à cinta? Ou vestir-lhes fraques e deixá-los entregarem-se a uma política e a uma diplomacia de infusórios e nós sentarmo-nos ao lado, com o microscópio? Ou sentirás vontade de possuir um realejo com ratinhos estéticos, brancos como o leite, a correrem à roda? Vamos construir um teatro? (Lena encosta-se a ele e abana a cabeça em sinal de negação.) Mas eu sei bem o que tu queres: mandamos partir todos os relógios, proibir todos os calendários, e contamos as horas e as luas só pelo relógio das flores, só pela florescência e pelo fruto. E depois cercamos o nosso reinozinho com espelhos ustórios para nunca mais haver inverno e para nos podermos destilar, no verão, até Ischia e Capri e para estarmos todo o ano no meio de rosas e violetas, de laranjas e de louros.

Valério - E eu vou ser Ministro de Estado e vai sair um decreto que quem fizer calos nas mãos será declarado interdito, que quem cair doente por trabalhar demais incorrerá em crime, que todo aquele que se gabar de ganhar o pão com o suor do seu rosto será declarado doido e perigoso para a sociedade humana, e depois deitamo-nos à sombra e pedimos a Deus que nos mande macarrão, melões e figos, gargantas melodiosas, corpos clássicos e uma religião confortável.


© Josef Koudelka. Prague. Play: Wanting for Godot.


posted by Anónimo on 22:00


 
as 7 pancadas de Molière

para mim, a arte é uma forma de respiração e eu respiro 24 horas por dia, como toda a gente. Os negócios faço-os nos intervalos desta respiração e correspondem, portanto, a pequenas faltas de ar…, dizia António Pedro

No Duas Colunas (é o jornal do Teatro Nacional São João) de Março há um artigo que vale a pena ler. É sobre o António Pedro – o homem-público e o mérito agrícola– e começa assim:
António Pedro? É ir à Internet. É um mecânico de automóveis última gama, um jardineiro para todo o serviço, ainda que especialista em orquídeas, o gerente de uma funerária, em Montpellier, que se chama “Et pourquoi pas?”, um especialista em corujas, ou – propomos nós – um dos intervenientes centrais de três décadas da realidade cultural portuguesa e um prurido no seio do surrealismo português.
[…]


Procurem o jornal (para mais é de borla) e vá lá, comemorem o teatro, leiam este artigo do António Cabrita. Vale mais do que muitas peças que se fazem por aí. E se se entusiasmarem, procurem o livro Escritos sobre Teatro, de Fernando Matos Oliveira e o documentário de Edgar Pêra O Homem-Teatro. Artigo, livro e filme são obviamente dedicados a António Pedro.


©Josef Koudelka. Prague. Play: The Three Sisters.1966.

p.s. como já repararam, antecipamo-nos à data oficial e abrimos o pano antes do tempo

posted by Anónimo on 21:43


 
A vida nas cidades

Começa amanhã no auditório de Serralves um ciclo de cinema dedicado às cidades. É um programa paralelo à exposição "Fotografias , 1979 Hoje", de Thomas Ruff. As sessões são às 21h30.

26.03 > Alphaville (Une Etrange Aventure de Lemmy Caution) (1965), de Jean-Luc Godard

02.04 > De l'autre côte du Périph (1997), de Bertrand Tavernier e Nils Tavernier

09.04 > Johannesburg, carnets d'un urbaniste (1998), de Stephen Oriach e Chandigarh, le devenir d'une utopie (1999), de Sylvain Roumette

16.04 > La haine (1995),de Mathieu Kassovitz





Not all the inhabitants died, but they were all stricken

Those not asphyxiated by the absence of light...
...sped about crazily, like ants
It was 23.15, Oceanic Time...
...when Natasha and I left Alphaville by the ring road
A night drive across intersidereal space, and we’d be home

Johnson: Don’t look back
Natasha: Do you think they’re all dead?
Johnson: Not yet
They may recover, and Alphaville will be happy, like Florence
Like Angoulême City, like Tokyorama
Natasha: Have I slept for long?
Johnson: No, just the span of a moment
Natasha: Where are we? In the Lands Without?
Johnson: Not yet
Natasha: You’re looking at me very strangely
Johnson: Yes
Natasha: You’re waiting for me to say something to you
Johnson: Yes
Natasha: I don’t know what to say
They’re words I don’t know
I wasn’t taught them
Help me
Johnson: Impossible, Princess. Help yourself, then you’ll be saved
If you don’t, you’re as lost as the dead of Alphaville
Natasha: I
love
you
I love you

The End

A não perder: o filme do Godard. Por muitos motivos, por exemplo Eddie Constantine (Lemmy Caution) , Anna Karina (Natacha Von Braun), Raoul Coutard , Paul Éluard,...

posted by Anónimo on 13:26


 

Nota a propósito das notícias do dia.


A frase seria de Lorenzo di Médici não fosse o pormenor de lhe ter sido atribuída no romance de Pierre La Mure, ‘La vida privada de Mona Lisa’. Será pois em princípio imaginação do autor (?). Achei-a extraordinária quando li o livro e lembrei-me dela hoje enquanto lia o jornal. Originariamente, está escrita no pretérito imperfeito, como é compreensível numa narrativa daquele tipo. Deixo-a no presente porque o presente a pede. E também porque é no presente que se escrevem as coisas que se desejam muito.



As nações não passam à posteridade pelas suas batalhas ou pelas suas riquezas, mas pela beleza que conseguem criar. No fim, a única coisa perdurável é a arte.



posted by camponesa pragmática on 12:51


 
A internet, ainda a velocidade de luz num campo de guerra...

um diário de guerra que não devia existir (pelas razões que todos já conhecemos):
http://dear_raed.blogspot.com

a citação em destaque do blog:
"the West won the world not by the superiority of its ideas or values or religion but rather by its superiority in applying organized violence. Westerners often forget this fact, non-Westerners never do."
Samuel P. Huntington


posted by Anónimo on 11:09


 

E em junho o novo dos Radiohead


«Hail To The Thief» é o título do sexto álbum dos Radiohead. Mais informações aqui:
Radiohead



posted by Anónimo on 10:59


segunda-feira, março 24, 2003  
Novo álbum de Tricky em Maio

O novo álbum de Tricky, "Vulnerable" , com saída marcada pra o dia 16 de Maio, tem como alinhamento:
"Stay", "Anti-matter", "Ice pick", "Car crash", "Dear God", "How high", "What is wrong", "My mermaid", "Moody", "Wait for God", "Where I'm from", "The love cats" e "Search and survive". Fala-se de um retorno aos tempos de "Maxinquaye" (1995).


posted by Anónimo on 21:03


 

© Igort

Quadrado # 04


Recebi, na última semana, por correio, o último número (4) da revista Quadrado. A abrir uma história, a duas cores, de Igort. Ensaios compridos. Domingos Isabelinho (o don quixote dos quadradinhos)escreve sobre o autor italiano Guido Buzzelli.Pedro Moura sobre o Diário de K, de Filipe Abranches.Alexandra Dias produz um ensaio muito académico sobre um "friso" de Almada Negreiros. Das dozes histórias que integram Frisos publicados no Orpheu 1, Alexandra Dias selecionou A Taça de Chá (lindíssimo, diga-se de passagem.) Para além dos ensaios,há uma entrevista com José Muñoz e obviamente há as histórias. Mas nada como ter a revista pra a descobrir, pouco a pouco. quadradinho a quadradinho.


posted by Anónimo on 19:28


 


Jeanne d'Arc au Bûcher

Em Janeiro, a actriz francesa Isabelle Huppert (genial!!!) esteve em Portugal para incorporar a peça mais poética de Sarah Kane. Agora, regressa, de novo, ao nosso país pra "vestir" a pele da heroína Jeanne d'Arc.

Jeanne D'Arc, "Show" Religioso
Isabelle Huppert em Estado de Graça

A antena 2 transmitirá directamente, do Teatro Nacional de São Carlos, a oratória dramática em onze cenas “Jeanne d’Arc au bûcher” composta em 1935 pelo compositor suiço Arthur Honegger, sobre um texto do poeta e dramaturgo francês Paul Claudel.
Hoje, às 19h55 .



posted by Anónimo on 18:53


 
Il Deserto rosso



O uso da cor e a transposição para a película da crueza da paisagem industrial e da vivência conturbada que Giuliana, papel interpretado por Monica Vitti, faz desse cenário mereceu a Michelangelo Antonioni o Leão de Ouro e o Prémio Especial da Crítica no Festival de Veneza por este Deserto Vermelho. Giuliana é a mulher de um industrial que vive no limite da sanidade mental, perturbada e alienada pelas vozes e sons electrónicos que só ela ouve, fruto da sua relação destrutiva com o mundo moderno. Distante do marido Ugo – Carlo Chionetti – e perturbada pela tecnologia que os rodeia, encontra na relação com Corrado – Richard Harris – uma amizade polvilhada por atracção sexual que não a afasta das preocupações com o filho nem da demência.

©Públiconline

Deserto Vermelho (Il Deserto rosso). De Michelangelo Antonioni, com Monica Vitti, Richard Harris, Carlo Chionetti, Xenia Valderi, Rita Renoir. Ita, Fra, 1964, 120 min.  Hollywood. Logo às 23h00

posted by Anónimo on 18:34


domingo, março 23, 2003  
(Evita as tentações da teoria: o poema é uma coisa veemente e frágil. E não é frontal, mas insidiosa)*

Comemorar a poesia em clima de guerra deu origem a discussões. Li há bocado no Público os pormenores.
"O poeta não é um iluminado, como os românticos pensaram. É uma pessoa como qualquer outra qualquer. Só há um tipo de critérios para avaliar a poesia, que são os poéticos", disse Pedro Tamen para acalmar os ânimos, e (apesar de um lapso que o fez trocar poéticos por políticos) acho que tem toda a razão. É uma frase clara e sensata… mas ao mesmo tempo fico com as minhas dúvidas, se um poeta é como outra pessoa qualquer deve ter muitas dificuldades em separar os poemas que escreve das outras palavras que lhe vão na cabeça. Pode jogar ao Dr. Jekyl vs Mr. Hyde ou pode dizer como o António Franco Alexandre, "Apenas vou ler uns poemas insignificantes" (e o desdém desta afirmação é encantador), mas será que consegue não misturar as coisas? Será que consegue preservar a fragilidade?

* apropriação descarada de Herberto Helder (Photomaton & Vox)

posted by Anónimo on 21:38


 
visita de estudo

Centro de Artes Visuais | Encontro de Fotografia, 23.03.2203

Fui finalmente a Coimbra visitar o CAV. Gostei muito, claro que não é surpresa, tinha saudades dos Encontros de Fotografia e o reencontro só podia ser emocionante.

Vamos por partes. O trabalho do arquitecto João Mendes Ribeiro na reconversão do Pátio da Inquisição é delicado, preserva o que deve e no mais é contido. Gostei das escadas e dos escritórios-contentores (a mesma solução que o Souto Moura adoptou no Edifício da Alfândega). Mas a obra ainda está no início, havemos de ir assistindo às mudanças.

A exposição dedicada a Coimbra traz-nos fotografias familiares. Foi bom rever as fotografias do Plossu mas foram os fotógrafos portugueses, os preferidos. Os animais empalhados do Molder, a viagem de Augusto Brázio ao Ingote cigano (está lá uma das mais belas fotografia da exposição), as duplas da Inês Gonçalves, e no topo, sem qualquer dúvida, as fotografias do Paulo Nozolino, cheias de grão, numa provocação ao preto como só ele sabe fazer.

Já não esperava mais nada mas havia uma cereja para fechar a visita: a escultura de Rui Chafes Aproxima-te, Ouve-me. É uma esfera em ferro, suspensa por cabos de aço. É um asteróide ferido. É tão bela que só posso dizer para a irem ver, vale a viagem, vale tudo, ouçam-na!

Há dois textos difíceis mas magníficos de João Miguel Fernandes Jorge e esta citação de Aristóteles, da Metafísica. Acabo pelo princípio.

“Todos os homens desejam naturalmente saber; mostra-o o prazer causado pelas sensações, porquanto mesmo fora da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmo e, mais que todas, as sensações visuais”

posted by Anónimo on 18:28


sábado, março 22, 2003  
A secreta vida das imagens

É um curso livre, ministrado por João Barrento e tem como objectivos: alargar os níveis de conhecimento da comunidade sobre literatura e cultura portuguesas, e sensibilizar para temáticas culturais essenciais para a compreensão do nosso século (transcrição da fotocópia conseguida com algum esforço).

O programa divide-se em quatro partes: introdução teórica, introdução histórica, a poesia portuguesa moderna e contemporânea e sua relação com as artes visuais e alguns exemplos paradigmáticos: comentário de exemplos seleccionados

O curso vai decorrer na Biblioteca Municipal Almeida Garrett, de 7 a 11 de Abril, das 17h30 às 20h30.

Para mais informações e inscrições, contactem:
Biblioteca Municipal Almeida Garrett > tel. 22 608 10 00 > Iria Marques


© Jorge Molder

A casa estava silenciosa e o mundo estava calmo.
O leitor tornou-se o livro; e a noite de verão

Foi como a existência consciente do livro.
A casa estava silenciosa e o mundo estava calmo.

Wallace Stevens, traduzido por Luís Quintais, in Umbria
The House Was Quiet and the World Was Calm




posted by Anónimo on 22:08


 
Marc Chagall

Chagall, le peintre à la tête renversée. Amanhã às 21h45 no mezzo. Este documentário sobre a obra do pintor russo foi realizado em 84, por Dominik Rimbault e ganhou o Prémio de melhor argumento no festival international do filme de arte de Paris (1985). Vale a pena ver. É uma boa preparação para as Litografias expostas na Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva (até 13 de Abril)


The Promenade (1917)


posted by Anónimo on 21:37


 
Entrée



É a nova colecção de preço reduzido da Deutsche Grammophon. Pretende, como todas estas edições, apresentar um repertório básico, bom, e a preço acessível. Até aí não há nada de novo mas estes discos têm uma particularidade: as capas. Em vez de capas coloridas e, muitas vezes, feias e com grande dessarranjo gráfico, a Entrée piscou o olho à música contemporânea e ao jazz e vestiu-se com fotografias a preto e branco. É uma estratégia de marketing mas gostei.
Já há 21 CDs editados. A lista pode ser consultada aqui

posted by Anónimo on 20:57


 


We love The sons of Lee Marvin

Depois do ciclo prometido ao Tom Waits pela Cinemateca, descobri que a zero em comportamento (associação que merece toda a nossa admiração cinéfila), vai fazer uma visita à obra de Jim Jarmush, em Maio.

Li a notícia no verso da capa do Y de ontem, um bocado à pressa. Como o artigo não está on-line e a zero em comportamento ainda não diz nada sobre a programação de Maio no site, não consigo garantir se será uma retrospectiva integral, mas espero que passem Permanent Vacation e Stranger than Paradise.
Marquem na agenda o encontro com mais um filho de Lee Marvin.

posted by Anónimo on 00:51


 
Aparições no Poço


Quando chegam as primeiras nêsperas
ao lado florescem as cilindras
e as folhas de bambus amarelecem.
O mirto aguarda, entre laranjeiras
elevam-se famílias daninhas.
Há quem chame Deus às legendas
que acompanham a película da terra.
Dentro (isso é certo) nas entranhas
de tudo existe um cronómetro sádico.


António Osório



Não só as árvores

Não só as árvores detinham ruídos misteriosos.
Havia o apelo tocante do amola-tesouras;
o ronronar do fogareiro do petróleo
aquecendo a cara e a cozinha;
a buzina pedinte do carvoeiro;
o atrito da roda, húmida de lama,
as mãos ágeis, deslizantes, dos oleiros;
o estremecer da lã cardada pelo colchoeiro;
a trepidação enraivecida dos canos pelas paredes;
e a corrosão mineira do caruncho
expelindo colinas de pó e escombros.

António Osório


posted by Anónimo on 00:00


sexta-feira, março 21, 2003  

Inscrição

Quando morrer voltarei para buscar
os instantes que não vivi junto do mar


Sophia de Mello Breyner Andresen



Há ainda as glícinias caídas do lado
de lá do muro
o canto dos tanques no recanto do caminho
a rede na porta
a luz do sul que se fazia a norte
há na casa um calor húmido deixado pelo frio
e há Agosto
manchas de mosto num tempo ou lugar onde
a voz de Lotte para sempre ecoaria

Maria Andresen de Sousa




Na Rua das Mónicas

Nos meus vinte anos,
almoçar em casa de Sofia
era ouvir ferver em cachão, frigir
na cozinha,arfar a cafeteira da poesia.
Era ver a ama de Sofia,
e de todos os filhos,de muitos versos,
cuidar de muitas gerações de memórias,
no lar desses versos tão caseiros.
E era beber, ali, na mesa,uma água
que, mais do que a da torneira,
concitou o mar para cada copo.
Era olhar um rosto de coral
(o que exorciza as Fúrias,na cozinha)
um rosto de mar novo, de geografia.
Era escutar as palavras da boca
do vocábulo grego para sabedoria,
o que me confirma o poder dos nomes,
ao serem Verbo,sobre os seres e as coisas.
Era sentar-me, lado a lado,
no espaço irradiante da volúvel lareira,
no Outono apagada, na Primavera acesa,
e com o fogaréu alimentado
por papéis venais de outra política
(que não a da sua humanidade),
que a prudência mandava destruir no fogo.
Era entrar e sair pela porta das Mónicas,
a das mulheres congregadas
sob invocação da mãe de Agostinho,
o que para mim celebrava também
o amor de mãe, da velha ama, da Poesia.

Fiama Hasse Pais Brandão




posted by Anónimo on 23:55


 
Semáforos

Nada te espera, prosa.
Levanta-te e caminha, como fez o outro.
As imagens guardam o seu tempo de exaltação.
Os sentimentos, não.
Não te preocupes com o homenzinho triste
que entrava o teu caminho, a porta não adivinhada.
O homem dos quarenta anos pede-te boleia.
Não olhes, não ligues, resiste aos seus lamentos
de cabra desgarrada em cima duma pedra.
Ele quer é seduzir-te com a infância,
essas crias medrosas que nunca soube orientar
e não sabe agora o que fazer com elas.
O teu destino é outro. Continua.
Se o homenzinho chora, atira-lhe ao olhar
toda a imensidão da relva que lhe resta.
O que ele quer é seduzir-te com amores,
as fátuas labaredas do desterro
e de vergonha.
O teu futuro és tu. Cresce e aparece.
A prosa que se preza não dá ouvidos a gente
que traz nas mãos um punhado de víboras
afinal tão amestradas.
Se o homenzinho implora, indica-lhe o lugar
a que tem direito no circo:
uma pista feita de memória
e toda uma plateia que cansada urra
e que o pateia.
Nada te espera, prosa.
Deixa o homem gritar.
O mundo das imagens é só seguir em frente
e nunca alcançar a rosa.


Armando Silva Carvalho




A POESIA VAI

A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não
acabarem). Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei: "Que fez algum
poeta por este senhor?" E a pergunta
afligiu-me tanto por dentro e por
fora da cabeça que tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
- Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor que chegar? -


Manuel António Pina




posted by Anónimo on 23:52


 


Hoje é o Dia da Árvore e dei por mim a pensar nas árvores de que gosto.

Lembro-me de uma ameixoeira em casa da minha avó, dos limoeiros do liceu, dos plátanos do Marquês, das cameleiras espalhadas pela cidade, do jacarandá que fica ao cimo da rua da Restauração, das tílias e dos rododendros do Palácio de Cristal, das árvores de Serralves, da pitangueira que vi no Jardim Colonial em Belém, das laranjeiras das ruas de Moura ou Vila Viçosa. Das magnólias que estão a invadir o Porto (mas as mais bonitas são as duas – uma branca e outra cor-de-rosa – que florescem, desencontradas, à entrada da Casa das artes), das palmeiras que se encontram onde menos se espera, dos campos de oliveiras no alentejo,das cerejeiras de kioto (que nunca vi mas gosto na mesma), das araucárias da Graciosa,...

Mas a minha árvore preferida esconde-se no jardim da Casa das Artes. Imagino que nunca foi podada e imagino que tem muitos anos porque o seu tronco é muito largo. É a árvore mais bonita e mais “árvore” que conheço.

posted by Anónimo on 13:39


 
As Árvores Botticellianas

O alfabeto das
árvores

esvai-se na
canção das folhas

as hastes interceptadas
das finas

letras que enunciavam
o inverno

e o frio
iluminaram-se

de verde vivo
com

a chuva e o sol —
Os rigorosos e simples

princípios dos
ramos rectos

vão sendo alterados
por íntimos

retoques de cor, cláusulas
devotas

os sorrisos do amor —
……

até que as frases
nuas

se movem como o corpo de
uma mulher debaixo do vestido

e louvam com sigilo e
desejo

a supremacia do amor
no verão —

No verão a canção
canta-se por si

sobre a surdina das palavras —

William Carlos Williams
(tradução de José Agostinho Baptista)




posted by Anónimo on 13:23


 

Conversas doentias no Boogie Woogie.


Esta indiscreta doente-de-fotografia agradece à indiscreta Cristina o milagre das caixas de comentários na salinha de exposições e avisa a navegação que por ideia da indiscreta Lídia há agora conversas fotográficas no Boogie Woogie.

posted by camponesa pragmática on 12:46


quinta-feira, março 20, 2003  

Digas o que disseres, não digas nada

I
Escrevo logo após um jornalista inglês
“sobre isto cá da Irlanda” pedir “pontos de vista”.
E nos quartéis de inverno eis-me outra vez
onde não é notícia notícia má que exista,

onde os homens dos media farejam e perguntam
e zooms, gravadores, cabos em rodopio
põem hotéis em desordem. Os tempos desconjuntam
mas das contas de um rosário me fio

tanto como de análises e frases
da gente dos jornais, da política élite
que da longa campanha escrevinhou, dos gases
e do protesto e de armas, gelinhite,

que em seu pulsar provou “escalada”, “reacção”,
“repressão”, e “braço militar”, e “tanto”
ódio de longa dura” e “polarização”.
Porém eu vivo aqui, eu também vivo aqui, eu canto,

falo hábil, civilmente, com vizinhos civis
no arame das primeiras transmissões sem fio,
sorvendo o gosto falso, o pedernal matriz
de estafada resposta com bafio:

“Oh concordo, decerto, é uma desgraça incrível”,
“Onde é que isto termina?” “Inda o pior provoca.”
“São assassinos.” “O internamento, compreensível…”
A “voz da sanidade” está a ficar rouca.

Seamus Heaney
(tradução de Vasco Graça Moura)

O original, em inglês e completo


posted by Anónimo on 13:29


quarta-feira, março 19, 2003  
Krzysztof Kielowski



Foram duas boas surpresas, os filmes de Krzysztof Kielowski que passaram na rtp2. Realizados alguns anos antes da Trilogia que lhe iria trazer a fama, estes filmes têm algo que me atrai profundamente.

Pessoal passa-se num teatro, metáfora do país e local de invejas, e mostra as hipocrisias de um regime que se pensava superior. O jovem Romek, tímido e deslumbrado, começa a trabalhar nos ateliers de costura de um teatro. Um colega, mais incorformado alerta-o para a realidade: na escola estudaram história da arte, criaram expectativas, mas quando começavam a trabalhar, ia tudo por água abaixo, reduziam-se a coser uns trapos e a servir as estrelas caprichosas.
O filme termina com um plano em que o rapaz tem de escolher. Assinará a denúncia do seu colega ou não?

Um curto dia de trabalho, rodado em 81, é o relato do que aconteceu nos finais dos anos setenta, desta vez sem recorrer a metáforas – é mesmo na sede do Comité Regional do Partido que a acção decorre e a linguagem anda perto da reportagem documental (de onde o realizador vem).
Um secretário em ascenção é posto à prova. Frente à manifestação das pessoas contra os dramáticos aumentos de preços, e sem qualquer apoio do Partido, ele fica indeciso, não sabe o que fazer: ficar no edifício até ao fim ou fugir? Tenta conciliar as duas partes mas isso é impossível. O tom da manifestação já estava ao rubro, e o partido já tinha decidido a sua acção retaliadora: recorrer à violência e promover manifestações postiças, de apoio ao regime.
Gostei muito da cena em que o chefe da polícia o retira do edifício. O secretário veste um casaco de malha para se dissimular na multidão, mas o casaco não lhe assenta bem, as mangas dão-lhe um ar perdido e patético.

Talvez seja isto que me faz gostar dos filmes: o ar perdido dos personagens, as suas dúvidas.

Fica aqui um link para conhecer melhor Krzysztof Kielowski

posted by Anónimo on 14:48


 

A não perder logo às 19h45 no arte: WITH GOD ON OUR SIDE: The Rise of the Religious Right in America.

Uma série de David Van Taylor sobre as relações entre a religião e a política nos Estados Unidos, desde os anos 50 até aos nossos dias.

Mais pormenores aqui.


posted by Anónimo on 14:48


 
Cinema em francês na Casa das Artes

Começam hoje as segundas Jornadas do Cinema Francófono, iniciativa do Instituto Francês do Porto.
Os filmes são legendados em português e a entrada é livre.

Logo à noite é possível assistir a uma ante-estreia. Não sei pormenores sobre o filme mas descobri que a música é composta pela Jocelyn Pook, e isso é uma boa razão para ir ver/ouvir.



19.03. >Como é que matei o meu pai, de Anne Fontaine às 14h30 horas e 21h30
20.03. >O Oitavo Dia, de Jaco Van Dormael às 14h30 e 21h30
21.03. >A vida sonhada dos anjos, de Erick Zonca às 14h30; Fourbi, de Alain Tanner às 21h30
22.03. > Premier Noel, de Kamel Cherif e O confessionário, de Robert Lepage às 17h00 e Transferência mortal, de Jean Jacques Beinix às 21h30

posted by Anónimo on 10:21


terça-feira, março 18, 2003  

Segunda observação nada casual

Quando ouvimos “Objectivo Bagdad” não imaginamos uma cidade. Mas ela existe.






© Ilkka Uimonen / Magnum Photos
IRAQ. Baghdad. February 2003


posted by Anónimo on 18:21


 

Observação nada casual

No diariodigital o link para a guerra (chamam-lhe, eufemisticamente, crise do Iraque) está entalado entre as Crónicas e os Oscares.


posted by Anónimo on 17:59


 
Reconheço a minha ignorância: não li nenhum dos livros do Pedro Mexia ou do José Mário Silva, nossos vizinhos da Coluna Infame e do Blog de Esquerda.

É uma boa altura para começar. Prometo relato para breve.

posted by Anónimo on 12:23


 
Hoje há mais livros em volta na Culturgest

As novidades editoriais na área da Poesia são o motivo da conversa que junta Luís Quintais, Jorge Gomes Miranda, Jaime Rocha, Clara Rowlands, Pedro Mexia (assim mesmo a bold como na notícia do Público ) e Fernando Pinto do Amaral, no papel de moderador.
Os livros que vão estar em cima da mesa são:
Antologia Poética, Cecília Meireles, Ed. Relógio D’Água
Zona de Caça, Jaime Rocha, Ed. Relógio D’Água
Curtas-Metragens, Jorge Gomes Miranda, Ed. Relógio D’Água
ANGST, Luís Quintais, Ed. Cotovia
Eliot e Outras Observações, Pedro Mexia, Ed. Gótica

É às 18h30 e a entrada é livre, por isso não há razões para não aparecer.

posted by Anónimo on 12:12


segunda-feira, março 17, 2003  

Desconfiar de Alexandre Sokurov



Virou-se o feitiço contra o feiticeiro: não resisti ao link da Cosac & Naify. Mas o passeio valeu-me uma boa descoberta.
Gostei particularmente do artigo Tela de Mestre, de Hervé Gauville (publicado no "Libération", 25/11/1998):
DESCONFIAR de Alexandre Sokourov. Aos 47 anos, o cineasta russo cometeu uma vintena de filmes, cuja recepção permanece em âmbito obstinadamente confidencial. De saída, esquecer Andrei Tarkovski. O próprio autor declarou: "Jamais frequentei seus cursos, nunca o venerei e jamais continuarei o seu trabalho". Entretanto, dois de seus filmes, "A Voz Solitária do Homem" e "Elegia Moscovita" (terminados em 1987) são dedicados ao diretor desaparecido. Vai se saber por quê.
...


posted by Anónimo on 23:03


 
ANAGRAMA: E se o Manel nem vier à caça? Dá-me a pá, médium!

É uma das variações sobre um mote de Bernardim Ribeiro. Um divertimento feito pelo Alexandre Andrade com o consentimento de Georges Perec. Há mais no 1bsk. Leiam e divertiam-se.

posted by Anónimo on 22:30


 
livros e o luar contra a cultura
10>



A exposição que está em Serralves é um bom motivo para ler A Brutalidade dos factos - Entrevistas com Francis Bacon.
O livro, como o título indica, é composto por nove entrevistas feitas ao longo de vários anos (desde 1962 até 1986), por David Sylvester, pintor e amigo de Bacon.

O tom é de conversa, mas conversa lenta e inteligente. É bom ler as perguntas de Sylvester (até Bacon gosta) e depois, muito devagar, as respostas. Acompanhar os raciocínios e entrar no mundo de Bacon, no seu processo criativo, nas suas dúvidas e contradições, na sua voracidade.

A sinceridade do pintor é tocante. Fala-nos dos seus pintores preferidos, da forma como a tinta vai ocupando as telas, dos erros que o surpreendem e atraem, do acaso que o empurra, das fotografias e do cinema que o influenciam. Também fala da sua vida, das pessoas que foi conhecendo, dos ateliers que ocupou e da luz, ou não fosse ele pintor.

Nas paredes de Serralves há excertos das entrevistas mas isso não chega, aconselho mesmo o livro, para mais, está traduzido para português e editado no Brasil. Apesar de ser impresso a preto e branco (a versão a cores afastaria o livro das pessoas que mais precisam dele), a edição é excelente. Aliás, a Cosac & Naify tem um belíssimo catálogo que vale a pena conhecer, espreitem o site e descubram, por exemplo, que há uma tradução portuguesa deste livro.

Para quem preferir o original em inglês, há várias edições a circular pela fnac e pela loja de Serralves.

Deixo aqui umas perguntas e respostas para vos aliciar.

Francis Bacon - Você sabe, no meu caso, toda a pintura — e quanto mais velho fico, mais isso é verdade — é fruto do acaso. Bom, prevejo em pensamento, prevejo a imagem, mas dificilmente ela será executada como fora prevista. Ela se transforma em decorrência da própria pintura. Eu uso pincéis muito grossos, e, por causa da maneira como trabalho, muitas vezes não sei o que a tinta fará, e ela faz muitas coisas que são muito melhores do que se seguissem estritamente as minhas ordens. Isso seria obra do acaso? Talvez alguém dissesse que não, porque acaba tornando-se um processo selectivo que começa com algo imprevisto, seleccionado para ser preservado. A pessoa, é claro, procura conservar a vitalidade do imprevisto mas preservando também a continuidade.

David Sylvester - Qual a principal coisa que acontece com a tinta? São os tipos de ambiguidade que ela produz?

FB - E as sugestões. Outro dia, tentando desesperado pintar a cabeça de certa pessoa, usei um pincel enorme, um monte de tinta e comecei a pintar de uma maneira solta, muito solta; no fim, simplesmente já não sabia o que estava fazendo, mas de repente deu um clique e a coisa se transformou exactamente na imagem que eu estava tentando reproduzir. Mas não por causa de uma vontade consciente ou de qualquer coisa ligada à pintura ilustrativa. O que até hoje nunca se analisou é o porquê dessa maneira de pintar ser mais profunda do que a ilustração. Talvez seja porque essa pintura tenha uma existência totalmente particular. Ela vive por conta própria, como a imagem que se queria captar; ela vive por conta própria, por isso transmite a essência da imagem com mais profundidade. O artista assim pode expandir-se, ou melhor, diria que ele pode abrir as válvulas do sentimento, e desse modo pode remeter o espectador à vida com mais violência.

DS - E quando você sente que a coisa, para usar as suas palavras, “deu um clique”, isso significa que ela lhe deu aquilo que queria no começo ou que ela lhe deu aquilo que você gostaria de ter querido?

FB - Isso evidentemente nunca se consegue. Mas existe uma possibilidade de você conseguir, através do imprevisto, algo muito mais profundo do que aquilo que fora desejado desde o princípio.

posted by Anónimo on 21:43


 

Peça de Brecht vai chegar a Lisboa mas não ao Porto


A partir de amanhã, o Teatro Municipal São Luiz acolhe, até ao fim do mês, Baal, de Bertolt Brecht, co-produção com os Artistas Unidos que se estreou em Viseu (DN, dia 7) e seguiu para Coimbra. No mesmo calendário e noutro horário, no Jardim de Inverno, Anamar apresenta Wild Cabaret, proposta musical complementar à peça, escrita em 1918 e estreada na Alemanha dos anos 20.

A cantora não se limitará, porém, a interpretar temas de Kurt Weill (um dos parceiros musicais de Brecht) e Marlene Dietrich, passando pelos reportórios de Piaf, Gardel, Sinatra, Janis Joplin, Lou Reed e David Bowie (sessões às 23.45, após Baal: às 21.00).

Encenado por Silva Melo, Baal segue em Abril para Famalicão e Évora, mas já não vai em Maio ao Porto: o Rivoli cancelou há dias a co-produção. Devido a cortes orçamentais, segundo a directora.


© DN Online


posted by Anónimo on 16:35


 

E, em Junho, "Cantada" de




Adriana Calcanhotto promove o seu último álbum, "Cantada", em Junho, actuando no Porto (13 e 14 de Junho), em Lisboa (23,24 e 25), e nos Açores(16), Madeira (17), Coimbra(19), Castelo Branco (20) e Évora (21).



posted by Anónimo on 16:16


 

Em Abril, na Cinemateca, na rubrica ‘Cantores/Actores’, é a vez de...



... Tom Waits.


Ainda não há pormenores e no site da Cinemateca não se avança grande coisa. Há que esperar pela saída do desdobrável de Abril. Mal posso esperar.

posted by camponesa pragmática on 13:57


 

2 notas


Primeira Ontem fui finalmente ver as litografias de Chagall à Fundação Arpad Szenes/Vieira da Silva

Devia haver um cartão multicultural para pessoas entre os 25 e os 65. O orçamento duma pessoa vai-se quase todo em bilhetes de teatro, do HCP, de cinema, de museus, de música clássica. Um cartãozinho que dissesse que quem frequenta um determinado número (por exemplo, a partir de 5) de espectáculos/eventos culturais por mês tinha, digamos, um descontozinho... fazia-se uma atençãozinha. Era bem. Será que há mas está tão escondidinho que não sei?
Segunda Esta manhã, ao sair de casa, reparei que as árvores do largo, que ainda ontem de manhã estavam nuas, estão agora cheias de minúsculas folhas verdes. É belo ver um jardim renascer. Ao contrário dos espectáculos humanos, o da Primavera continua a ser gratuito :)


posted by camponesa pragmática on 13:41


 

Trilogia de Kielowski na RTP2 em 5 Noites 5 Filmes


Azul, 4ª feira – 19/3, às 00:00

Branco, 5ª feira – 20/3, às 00:00

Vermelho, 6ª feira – 21/3, às 00:00

Só não compreendo porquê à hora da Gata Borralheira.



posted by camponesa pragmática on 13:07


domingo, março 16, 2003  



Francis Bacon
1>

Será que realmente dá para você analisar a diferença entre a pintura que comunica directamente e a que comunica por meio da ilustração? Este é um problema extremamente difícil de ser expresso com palavras. É algo que tem a ver com o instinto. É uma coisa difícil, muito difícil e íntima saber por que certa pintura toca directamente o sistema nervoso e outra lhe conta a história num longo discurso cerebral.

Francis Bacon (do livro Entrevistas com Francis Bacon - A brutalidade dos factos)


posted by Anónimo on 17:06


 

Russos

Em 1993, quando decidiram começar, ninguém lhes ligou. "Mandámos cartas a 24 ou 25 editoras e não recebemos resposta de nenhuma." Sentada à mesa de um café do Chiado, Nina Guerra ri-se, ao contar isto, porque já passaram dez anos. Mas na altura esse silêncio fê-los desistir, por algum tempo. "Vivíamos em Vila Pouca de Aguiar, ninguém nos conhecia..."

Ontem o Mil | Folhas foi falar com a Nina e o Filipe Guerra. O artigo está aqui e tem um bombom no fim: qual é o clássico que se segue? Aposto na Guerra e Paz.
Depois de Akhmátova, Dostoiévski, Gogol, Mandelstam, Púchkine, Tchékhov e Tsvétaeva será que chegou a vez de Tolstoi?


posted by Anónimo on 16:54


 



Punch-drunk love é uma comédia romântica?

Oh sim! Mas o Paul Thomas Anderson perverte o tema. Não há flores, nem passarinhos, nem paisagens bonitas. A acção decorre em locais inóspitos: um armazém de revenda de desentupidores, um hotel , um aeroporto, um hospital, um supermercado de colchões, e corredores, muitos corredores. Os personagens não andam na lua: Barry Egan corre desenfreadamente (foge das irmãs e procura uma saída para a sua vida?) vai contra as coisas, cai, e Lena caminha de uma maneira, que se percebe que está bem agarrada à terra.

Mas voltemos ao início: há um homem que compra pudins para juntar bónus de viagens aéreas (apesar de nunca viajar), um dia compra um fato azul, aparece-lhe um piano à frente para dar um tom romântico e é então que surge uma mulher vestida de vermelho e…apaixonam-se?
Anderson atira-nos os clichés e depois diverte-se a tirar-nos o tapete. Aqui nada se passa como nos filmes. Ela não apareceu por acaso, o jantar não é romântico, e o efeito idílico provocado pelo plano que marca o encontro deles no Hawaii (é o plano que se vê no cartaz) é desfeito à noite quando eles trocam mimos amorosos pouco cor-de-rosa. Entretanto surgem alguns problemas com um mafioso - o brilhante Philip Seymour Hoffman -, que gere uma linha erótica de forma pouco escrupulosa e que acabam por ser resolvidos na magnífica cena em que Egan diz, com toda a clareza, que tem imensa força porque está apaixonado. Anderson no pico do romantismo.

No final, Barry Egan usa uma gravata vermelha e o último plano é magistral, quase podemos adivinhar: eles não foram felizes para sempre.

Adam Sandler e a Emily Watson são óptimos neste par romântico mas pouco ortodoxo. A música encaixa na perfeição e, intencionalmente, ouve-se uma canção repescada da banda sonora do Popeye: He needs me.


posted by Anónimo on 16:18


sábado, março 15, 2003  

Serge Prokofiev et Modeste Moussorgski par Antonio Rosado

Le pianiste portugais Antonio Rosado interprète la Sonate n° 8 en si bémol majeur (op. 84) de Serge Prokofiev et Tableaux d’une exposition, le chef-d’oeuvre de l’écriture pour piano de Modeste Moussorgski (1839-1881) composé en 1874.
Concert (2001, 65’) enregistré lors de La Folle Journée d’Ivan Ilitch à la Cité des Congrès de Nantes, avec Antonio Rosado.

Às 22h00 no Mezzo


posted by Anónimo on 18:07


 
Comboios

Estreia hoje na rtp2 às 20h10, Rail Away. Segundo a rtp online, trata-se de uma série de 14 documentários sobre viagens de comboio. A informação é escassa e não consigo perceber se o objectivo é turístico ou cultural ou uma mistura dos dois, só vendo. O episódio de hoje passa-se na Polónia. O comboio parte de Varsória até Auschwitz e, pelo destino, adivinho uma viagem muito dolorosa.

Entretanto, e como gosto de comboios, aconselho uma outra viagem, sonora e quase palpável. A entrada para a gare é por aqui



Já agora, deixamo-vos com o press-release de "Orient Express" elaborado pela distribuidora portuguesa da Winter & Winter (a AnAnAnA) que, como sempre, está excelente:


Ao partir para um novo projecto, Stefan Winter não opera de uma forma muito diferente de, digamos, um cineasta. Há uma ideia vaga sobre um retrato, uma imagem que se insinua em momentos do quotidiano e que reaparece nas altas horas da noite. E com ela vem uma história qualquer que é forçoso conhecer-se. Depois, se tudo correr bem, há um conjunto de coincidências e suficiente informação acumulada em livros para abrir o caminho. Desenha-se um contorno estético e procuram-se cumplicidades cruzando-se férteis terrenos entre as artes. Passam dias, semanas, meses e, às vezes, anos. Por fim, baixam-se as resistências e aceita-se a inevitabilidade da solidão. Por momentos tudo parece ter voltado ao início... a página está em branco e convém violá-la. Stefan Winter pega numa caneta e escreve a curta sinopse do seu novo filme. Agora é o começo de uma outra história...

Orient Express – From Paris to Constantinople
Este ‘diário musical’ conta a viagem do Expresso do Oriente, de Paris a Constantinopla, em Junho de 1905. Os passageiros e seus familiares juntam-se no átrio principal da estação de Paris Est e preparam-se para a partida. Enquanto se trocam despedidas e se marcam reencontros, ecoam por entre o mármore das paredes e o cristal dos lustres as notas de um solitário saxofone em lamento cigano. Já com todos a bordo, uma musette faz as despedidas de Paris. Puccini, Strauss, Bizet, Schubert e Brahms são os companheiros desta viagem até ao extremo sudeste europeu. Mas apesar da familiaridade dos sons, tocados pelo quarteto de cordas e pelo pianista do bar, todos sabem que esta é uma viagem até um mundo diferente.

Franceses, Ingleses, Austríacos, Alemães e Húngaros estão a bordo do comboio. Em Munique são recebidos com marchas por uma banda de metais. O clima descontraído proporciona uma agradável distracção para os passageiros. De novo em marcha, é dada a partida para Viena com a novidade musical do momento, a ‘Habanera’ da recém-estreada ópera de Bizet, Carmen. O seu sucesso chegou a todos os pontos da Europa e a excitação é grande.
Enfim Viena. A mais sumptuosa cidade Europeia está movimentada. Por entre o rebuliço de quem entre e sai ouve-se, ao fundo, o ‘Danúbio Azul’. Viena representa uma luxuosa monarquia, e, até certo ponto, é o ex-líbris de uma certa ideia de Europa que fica para trás à medida que o comboio avança. Ouvem-se agora danças Húngaras, prevendo Budapeste. Vozes búlgaras. Atravessa-se a fronteira da Roménia. Aos poucos, ciganos transformam a sua carruagem num salão de festas. Mas no Bar, uma solitária mulher evoca o seu passado amoroso, pedindo ao pianista para tocar mais Puccini. No meio do campo búlgaro, o comboio pára sem aviso. Há reparações técnicas a fazer. Dos terrenos cultivados vêm cantos de trabalho das camponesas. É tempo de se prolongar a festa com os ciganos a bordo e os habitantes da aldeia mais próxima, curiosos pela paragem do Expresso do Oriente.
Quando a maioria dos passageiros acorda já o comboio se dirige a grande velocidade para Constantinopla. O mundo Ocidental é tudo o que está para trás. Quando o comboio chega à sua derradeira estação tudo é diferente: os sons, os aromas, as cores, as pessoas.

Para desenvolver este projecto, Stefan Winter contou com a preciosa ajuda de Stian Carstensen (o acordeonista norueguês de descendência búlgara, responsável pela revelação de Trifon Trifonov e do coro feminino no já editado «Farmers Market»), Fumio Yasuda (o pianista do recente «Charmed with Verdi») e do polaco Kwartet Prima Vista.





posted by Anónimo on 17:45


 

Que sorte: entrar no autocarro, abrir o embrulho e descobrir este livro:

«Ouve-me, Buddy», lia numa novela
de Truman Capote: «só existe
um pecado imperdoável.
A crueldade premeditada»


© Henri Cartier-Bresson (a fotografia mais bonita do Truman Capote)

p.s. é o final do poema Ribeiro Frio do livro Longe não sabia, de José Tolentino Mendonça


posted by Anónimo on 00:00


sexta-feira, março 14, 2003  

O amigo americano

Temos um, não se chama Tom Ripley mas vive em Nova Iorque e anda a inventar a memória. No seu blog, ainda em versão beta, promete: Portugal para leigos, desactualidades, "coisas pequeninas", mentiras de um desterrado e uns postais de New York. Vamos fazer colecção!


© Edward Hopper (New York Movie, 1939, oil on canvas. In the collection of the Museum of Modern Art, New York)


posted by Anónimo on 21:56


 
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