Há tempos, numa entrevista, pediram-me que indicasse a minha canção favorita. Naquele momento não fui capaz de destacar uma. Nem uma nem duas. Nem três. Agora, tenho muito claro que a canção mais perfeita que até hoje ouvi (e que tenho passado na IF ao longo destes 19 anos) é GOD ONLY KNOWS , dos Beach Boys.
…
Tati avait coutume de dire aux apprentis cinéastes: "Le cinéma, c'est un stylo, du papier et des heures à observer le monde et les gens". Pour écrire ses films, du premier au dernier gag et en prévoir tous les rouages; pour imaginer, sur la bande-son, le moindre bruit, sa modulation, son intensité, son rythme; pour faire exister, avec un visage, des vêtements, une silouhette et des signes particuliers, le plus humble des personnages, à peine entrevu sur l'écran, Tati avait besoin de temps et le prenait. Quatre ans entre “Jour de fête” et “Les Vacances...”,cinq entre “Les Vacances...” et “Mon oncle”, dix entre “Mon oncle” et “Playtime”.
Un an après la fin du tournage, Tati s’attache encore à la sonorisation de son film. Avec le 70 mm, il a découvert la stéréo, l’enregistrement multipistes (six à l’époque) et la possibilité d’agencer le comique, grâce aux bruits, en dirigeant l’œil du spectateur. Rien n’a été enregistré pendant le tournage. Tout est reconstitué ensuite, piste par piste, phrase par phrase, bruit par bruit. Jacques Maumont, l’ingénieur du son, se souvient ainsi de soirées passées sur les hauteurs du mont Valérien ou dans un parking désert à faire tourner des moteurs de voiture.
Ou d’un voyage à Munich, chez Siemens, pour enregistrer les bonnes combinaisons de fréquences émises par un générateur. «On n’en sortait jamais», dit Maumont.
Silêncio nasceu de uns amores ilegítimos entre um cigano (Georgio ) e uma jovem camponesa (Violante). É mudo e um bocado tonto. Não conhece o ódio e dá-se bem com as cobras. Nasceu em Belossonho, um lugarejo das Ardenas, por volta da Segunda Guerra Mundial e é a personagem principal deste romance (em oito capítulos), desenhado por Didier Comès.
É uma bela e comovente história. Por ela passam dois sons: o vento, constante e o mar, escutado através de um búzio.
Visita guiada: entrem por favor por aqui e depois, lá em baixo, cliquem no site de Comès e aí em “flash”.
Nota: há uma edição do “Silêncio” (de 1983), a preto e branco da Bertrand e outra, muito recente, a cores, das Edições Asa.
Logo há mais uma edição de Íntima Fracção . Mas, até quando?
Continuamos sintonizados. Hoje, todos os links levam à IF.
You're walking. And you don't always realize it,
but you're always falling.
With each step you fall forward slightly.
And then catch yourself from falling.
Over and over, you're falling.
And then catching yourself from falling.
And this is how you can be walking and falling
at the same time.
An artist will try to capture its shape and copy it in his brain
A naturalist will examine the birds, insects and fungi that symbiotically live with it
A scholar of evolution will collect its DNA and find its place on the genealogical tree
A mathematician will attempt to solve the algorithm of the division of branches versus leaves and write down the formula
A clergyman will look to see God's design and grace in the tree
A shaman will try to feel the tree's vibrations and will see their correspondence with the universe
A pharmacologist will work to extract the antibacterial chemicals from the tree
An ecologist will measure the tree's nitrogen and carbon dioxide fixation capacity
Rather than thinking about all these things, I simply gaze at the tree in admiration
Sempre pouco para dizer, muito para escutar e tudo para sentir
# Giant Sand : No reply
canção suplementar # Billie Holiday : Willow weep for me
ÍNTIMA FRACÇÃO > 1 / 2 de Março de 2003
" Um visionário da Arqueologia imagina que, assim como o som gravado nos sulcos dos discos, as vozes dos pedreiros de outrora podem ter ficado entranhadas nos sulcos das antigas muralhas e templos, e só esperam uma 'agulha' adequada para voltar à vida." (David Lowenthal)
# Vincent Gallo: When
ÍNTIMA FRACÇÃO > 8 / 9 de Março 2003
" Assim, prossigo. Olhando uma tina de vidro muito transparente, onde o lodo depositado no fundo se agitou e, elevando-se, deixa a água turva, criando uma barreira à passagem da luz. Gostava de poder repousar os braços na mesa e ter tempo, lentamente, e ver os milhares de pequenas partículas a descer, libertando a água à sua pureza inicial, ao brilho da refracção. De novo à transparência. Ou então, prosseguir, até sentir com a cabeça e começar a pensar com o coração." (F.A.)
Ouve meu amigo
põe a máquina a gravar
queria só explicar aqui
que eu sou como o pano-cru
como pano-cru
eu ainda estou por acabar
e como o linho vem à terra
assim viemos eu e tu
e como tu eu faço e amo
e luto e dou
e como tu eu estou
entre aquilo que já fiz
e aquilo que eu fizer
eu sou de pano-cru
quinta-feira, setembro 11, 2003
A Inimigo Rumor, lida pelo Rui Manuel Amaral
Saiu para as livrarias o número 14 da revista luso brasileira "Inimigo Rumor", referente ao 1º semestre de 2003. Coordenada por Carlito Azevedo e Osvaldo Manuel Silvestre, esta edição é quase integralmente dedicada ao género conhecido por "poema em prosa" ou "prosa poética". A revista apresenta várias dezenas de textos de autores contemporâneos de diferentes nacionalidades, em especial de portugueses, brasileiros, espanhóis e argentinos, oferecendo uma imagem muito interessante da vitalidade que este género tem conhecido nos últimos anos. Desse imenso conjunto, onde também se inclui um grande número de textos dispensáveis, eu destacaria o pequeno ciclo de "poemas em prosa" do brasileiro Adalberto Müller e este "A Alma", do poeta japonês Amazawa Taijiro.
A ALMA
Depois que minha mulher voltou para casa, nós ainda, por algum tempo,não pudemos dizer-lhe; mas quando ela terminou de trocar suas roupas, eu a encaminhei para um pequeno quarto sombrio e avisei que M** morrera durante a sua ausência. Ergui a vela e tirei a tampa da cesta. Ao ver o cadáver hirto, minha mulher, com os braços esticados e olhos arregalados, ficou pálida, endureceu o seu rosto e disse: "Então, o que é aquele M** que está correndo lá naquele quarto!". Ao ouvi-lo, fomos nós que endurecemos o rosto e ficamos pálidos.
Amazawa Taijiro, tradução de Nobuhiro Fukushima.
Nota do autor: M** é o nome do gato que mora em nossa casa.
1. Para os fãs do Zeca Baleiro aqui fica a informação: hoje a Antena 1 vai transmitir um concerto do cantor brasileiro gravado no auditório da emissora. Para sintonizar às 17h00.
2. O que dizer do “Trouble every day” ? Polémico, chocante, devem ser as palavras mais fáceis. Mas o que fica do filme é essencialmente a preocupação estética de transformar o horrível em sublime. A fotografia é notável, lembrando às vezes as imagens de Miguel Rio Branco. O sangue é belo, assim como a pele, filmada em planos muito aproximados. Há poucos diálogos, é a banda sonora, suspensa e nostálgica, que marca o ritmo do filme. Os actores são lindissímos, vestem-se bem e cheiram bem. Mas isso não basta. Podia ser uma reportagem de moda, um anúncio de perfume mas não chega para ser um filme.
Lembrei-me de "Cat people", de Jacques Tourner e percebi a distância enorme que os separa.
3. Bem me parecia e ontem confirmei: o Vincente Gallo é a encarnação perfeita do Príncipe Mishkin.
4. Não conheço o Francisco Amaral mas já vi a Íntima Fracção.
Hoje às 21h45 Trouble every day, de Claire Denis, com música dos Tindersticks
Amanhã às 19h45, uma bela visita ao universo de Raymond Carver, Short cuts, de Robert Altman.
Para quem quiser mais, aqui fica uma lista de livros de Raymond Carver, editados pela Teorema. Infelizmente falta um dos meus preferidos, "Três rosas amarelas" que tem o belísssimo conto que narra a morte de Tchékhov.
Este foi um tema da silly season do ano passado no Pastilhas que agora vem espreitar à Janela.
Pseudo-Intelectuais; Intelectualóides; Pseudo-Intlectualóides – que “pseudos” são esses que desvirtuam a seriedade do espírito? O que os diferencia dos verdadeiros intelectuais? Quem são os visados pela troça?
Conta-se que Goebbels dizia que lhe dava vontade de sacar da pistola sempre que ouvia falar em intelectuais. Muitos ódios de estimação que estes geram mais não serão que uma forma de despeito por um poder que se pressente. Como na altura comentou o meu amigo maradona é capaz de ser preferível um pseudo-intelectual a um anti-intelectual mas também não há dúvida que há casos em que a troça parece ir ao encontro de quem a está a pedir.
Na Idade Média era muito comum esta chacota aos doutores. Os óculos na ponta do nariz tanto serviam para designar a seriedade do estudo como a ignorância de quem não entende do que fala ou a marca da loucura dos que deixam escapar a razão nesses devaneios.
Da esquerda para a direita:
1 - Festa de Loucos, gravura de Peter Brugel o Velho (detalhe). Os loucos com óculos Sátira dirigida aos religiosos - um deles é o escrivão, com o tinteiro e a pena mais o saco onde aferrolha as moedas de ouro -. São os tristes tontos, gelados e solitários, casados com o estudo. Os óculos em cima da cabeça não ajudam a que o saber entre, apenas reflectem a tontice que já lá está.
2 - O beato ou o falso converso agarrado ao rosário. Cadeiral da Igreja de S. Novcolau, Kalkar, Alemanha (1505/08)
Noutros casos afiguram-se como caricaturas dos que se entregam a prazeres espirituais mas nos terrenos lhes escapa a inteligência. Vítimas de um saber teórico, muito sábios mas muito fáceis de enganar pelas mulheres, Alexandre o Grande, Virgílio e Aristóteles não escaparam à troça. Virgílio pendurado no cesto que a amada prometeu içar até à janela do quarto ali ficou pendurado toda a noite para de manhã ser troçado pelos soldados romanos; Aristóteles fez de burro e deixou-se montar por Camtaspé para ser gozado por Alexandre e, mesmo este último, enquanto se embrenhava nos estudos não escapou às “facadelas” da amada.
Da esquerda para a direita:
1 - Lai de Aristóteles, cadeiral da Igreja de Montbenoît (sec. XVI)
2 - Lai de Virgílio, cadeiral da Sé do Funchal (c.1514/15)
O Lai de Aristóteles (c.1223) é atribuído ao clérigo e trovador normando Henri d’Alais. Phyllis, (também apelidada de Camtaspé) vinga-se de Aristóteles que aconselhara Alexandre a afastá-la pois achava que esta andava a distrai-lo da seriedade dos assuntos de governo. Numa dança sensual Phylis tenta o filósofo e promete-lhe favores se primeiro fizesse de cavalo e a passeasse, assim montada, em redor da sala do palácio. O sábio cai na artimanha e é apanhado nesta triste figura pelo discípulo. O talento da dialéctica ainda lhe permite argumentar que deste modo provava como estava certo pois se até um velho filósofo cai por causa das mulheres quanto mais um jovem na pujança da idade...
Pseudo-intelecutalóides também podem ser esses “burros carregados de livros”; “verbos de encher”; presunçosos como o Grand Patapouf; os “papagaios de salão” e os grandes “cagões” que todos nós conhecemos. Nos provérbios medievais flamengos e nos fabulários a sátira escatológica utiliza o termo nesse mesmo sentido- “o caganço”; “cagar de alto”, o “cagar para isso” que ainda hoje é tão usado.
cagar nos óculos (“os cagões”; “qual deles o mais cagão”, “cagam pelo mesmo cu”- não fazem nada um sem o outro), cadeiral da Igreja de Sainte- Materne de Walcourt, 1531
Aqui fica divertida sátira que Sebastian Brandt lhes dedicou na Nave dos Loucos.
Livros Inúteis
Conduzo a dança dos loucos
Pois estou rodeado de livros
nunca lidos e que nem compreendo.
Se vou à proa na nave
Não é sem justa razão
E bem-vindos os que bem me entendem:
Guardo um monte de tomos na minha casa
Que importa se não os não entendo:
Tenho na mais alta estima
os espanadores e mata-moscas
Ouvindo falar sabiamente,
Respondo: “possuo isso tudo em minha casa”.
Basta-me, para estar entre os anjos,
Rodear-me dos meus livros.
Diz-se que Ptolomeu tinha
todos os livros do mundo
e os considerava o seu tesouro
ordenava-os nas prateleiras
e não era mais sábio por isso.
Tenho tantos livros quanto ele:
Ao Diabo se nunca os li!
Haveria eu de perturbar o meu espírito,
De me atolar num montão de saber?
O estudo impede as quimeras!
Não posso eu, um grande senhor,
Pagar para que se instruam por mim?
E, ainda que tenha o espírito obtuso
Se estou entre doutos
Sei dizer em latim: “Ita!” Mas no registo alemão
Estou mais à vontade que em latim.
Sei que vinho se diz vinum Corno, qucklus, stulus cretino,
Faço-me chamar “douto sire”:
Basta-me esconder as minhas orelhas
Que ninguém descobrirá o burro do moleiro.
Sebastian Brandt, A Nave dos Loucos, 1494.
Bibliografia: GAIGNEBET, Claude; LAJOUX, Dominique, “Art profane et religion populaire au Moyen Âge, P.U.F., Vendôme, France, 1985.
MAETERLINK, Louis, Le genre satirique, fantastique et licencieux dans la sculpture flamande et wallonne. Les miséricordes de stalles (art et folklore), Jean Schmit, Libraire, Paris, 1910.
Telefono para um serviço do Estado e vejo-me imediatamente enredada num labirinto de extensões. Só na próxima extensão alguém saberá responder à minha pergunta. Imagino-me a contar a mesma história quinze vezes a seis pessoas diferentes e sinto um princípio de exasperação. À segunda espera dão-me música. Beethoven, a Sinfonia Heróica. Justamente Beethoven, na companhia do qual eu poderia passar o resto da vida num labirinto de extensões. E justamente a Heróica, a que eu não ouço há mais tempo e da qual tenho mais saudades. Não sei que pessoas decidem a música que é emitida nas esperas nos telefones do Estado, mas não brincam em serviço.
posted by camponesa pragmática on 12:17
terça-feira, setembro 09, 2003
Mark Twain em português
Há quem esteja a traduzir Mark Twain, só pelo prazer de o fazer… Admirável!
“Nao, tenho demasiados livros empilhados para ler, os que comprei e ainda não li, os da biblioteca, os do bookcrossing…”, estava a ser sensata mas estraguei tudo quando entrei na livraria e peguei nele: “Sempre se é bom demais com as mulheres”, de Raymond Queneau (o da "Zazie dans le metro", claro), traduzido pela Luiza Neto Jorge e editado pela Ambar.
Não resisti e trouxe-o para casa. Na contracapa diz que Queneau o publicou originalmente com o pseudónimo de Sally Mara, uma misteriosa e jovem escritora irlandesa que se estreava com um romance erótico. A acção decorre na Estação de Correios de Dublin, ocupada por revoltosos nacionalistas irlandeses, no início do século XX. O grupo de guerrilheiros que ocupa a estação expulsa todos os funcionários mas, ó desgraça, esquece-se de uma mulher…
Nota: faz parte de uma colecção que se chama gin tonic, ou seja, a regra 13 sem qualquer esforço.
De manhã ao passar pela mercearia vi, pela primeira vez este ano, marmelos. São um dos primeiros sinais do Outono. Trazem pó agarrado à pele e memórias. Lembro-me da minha avó a descascá-los e a cozê-los numa grande panela e do cheiro reconfortante que enchia a casa. E lembro-me também de “El Sol del Membrillo” de Victor Erice, um dos “meus” filmes, sublime e hipnótico.
No filme há um pintor encantado pelo marmeleiro do quintal. Estamos no fim do Verão, a árvore brilha e refulge em belas cores. O pintor vai fazendo marcas minuciosas para acompanhar o amadurecimento dos frutos mantendo a perspectiva. O que é que ele procura naquela árvore?
Um dia uma pintora chinesa visita o atelier improvisado no quintal e pergunta-lhe como é que ele pensa retratar a luz que incide na árvore. Como?
Já não me lembro bem da resposta, das palavras exactas mas sei que o pintor fala da impossibilidade de pintar a luz, fala dos limites da pintura. Sim, ele sabe tudo isso mas continua a pintar o sol sobre marmeleiro e refaz o quadro e quando a chuva chega e a luz se altera, desaparecendo aquele efémero que ele procurava, ele pára mas apenas para esperar de novo pelo instante certo.
posted by Anónimo on 19:00
Acabaram-se as cópias da programação do Bar a Barraca. Um mail proveniente de Changuito acabado de chegar à minha conta avisou-me da terrível boa nova - eles estão na blogosfera.
O derradeiro copy/paste:
«Caras amigas e caros amigos, eis-nos perante o dealbar de uma nova época barístico-cibernética e, como tal, cá estamos a dar a cara, o corpo e a poupa, por várias causas de sumo interesse nacional. Cientes de que, cada vez mais, o mundo é das crianças e de quem usa a Internet, aqui estamos declarando que a nossa comunicação futura tenderá a ser feita de forma asseada, secreta e indolor. Para tal, e sempre buscando a perfeição nórdica, contratámos os serviços de várias empresas da especialidade e decidimos criar um Blog (limpo, espaçoso e arejadinho) para a divulgação dos eventos deste bar. Para além da dita divulgação, aqui, como em qualquer empresa onde o funcionalismo público tem seu peso, damos valor às vossas opiniões. Também por isso, o dito canal agora criado vem responder à necessidade maior do século XXI: a interactividade (leia-se: duas ou mais pessoas, de rabo sentado em finíssimas poltronas Luís XV Moviflor, em qualquer canto do globo, premindo teclas, dando ordens de compra, encomendando comida ligeira, sentindo-se assim verdadeiras participantes de um mundo belo e civilizado.). Pois bem, o Blog será, a princípio, companheiro destas missivas semanais que, por perseguições várias e ameaças gravíssimas, tenderão, se a Sociedade Portuguesa dos Animais Que Nos Ameaçam não agir, a extinguir-se como verdadeiras achas de uma fogueira moribunda. Assim, resumindo, diremos que os e.mails continuarão a seguir enquanto nós estivermos vivos e de saúde, mas, a partir de agora, toda a verdade sobre as vidas de Vasco, Nelson Ned, Paula Bobone, Nuno Pala-Pala, Gisela, Changuito e o Avô Cantigas, bem como de todos os outros ícones da cultura do surreal lisboeto, estará disponível em:
www.bar-a-barraca.blogspot.com
ou ainda em:
www.bar-a-barraca.blogspot.com
leia-se:
www.bar-a-barraca.blogspot.com»
Estou com Laura Lorca e sei que estou a mais porque em rigor não é assunto meu, nunca será assunto meu. Mas a notícia causou-me, literalmente, náuseas. "Lorca pertence à Humanidade"? Isto é transpersonalismo descarado. Gibson quer saber se o espancaram mais ou menos e dedicou a esta investigação parte da sua vida?
Fiquei sem saber muito bem por que vão abrir a vala comum e a pedido e no interesse de quem em primeiro lugar. E, se podem distinguir os cadáveres, por que razão não os tratam consoante o desejo de cada família envolvida. Por que são os interesses de todos superiores aos interesses da família de Lorca?
Não concordo nada que Lorca pertença à Humanidade. A sua poesia, talvez, mas Lorca pertencia a si mesmo e já que não morreu em paz merecia ao menos descansar em paz. Acho tudo isto de uma curiosidade mórbida sem fundamento. Não acredito que saber se lhe deram ou não muito café torne a sua morte mais revoltante do que já é, do que tem sido sempre. O que é revoltante é que se queira saber se lhe deram ou não muito café. Que original "momento simbólico", que bizarra forma de prestar homenagem ao "espanhol mais amado em todo o mundo". Que notícia tão triste. Custa-me tanto como sabê-lo morto tão jovem e de forma tão vil.
posted by camponesa pragmática on 13:54
Shadow of a doubt
A não perder sob qualquer pretexto: Shadow of a doubt, de Alfred Hitchcock, logo às 23h00 no canal Hollywood. É uma obra-prima, um verdadeiro tratado sobre a suspeita e a dúvida. Merece muito mais que duas linhas, por isso o post fica em aberto...
posted by Anónimo on 10:02
Talking In Bed
Talking in bed ought to be easiest
Lying together there goes back so far
An emblem of two people being honest.
Yet more and more time passes silently.
Outside the wind's incomplete unrest
builds and disperses clouds about the sky.
And dark towns heap up on the horizon.
None of this cares for us. Nothing shows why
At this unique distance from isolation
It becomes still more difficult to find
Words at once true and kind
Or not untrue and not unkind.
Philip Larkin
A larkiana Zazie enviou-nos este poema com dedicatória. Mais logo coloco a tradução da Maria Teresa Guerreiro mas, na verdade, não há forma de traduzir a beleza dos últimos versos...
Abrir As Mil e Uma Noites e entrar, mais ou menos ao acaso, no início de uma das muitas sequências de histórias. Entrar e assistir, lá dentro, à abolição do tempo, cá fora. Depois há uma moinha eu-devia-fechar-imediatamente-isto-pois-já-estou-a-ler-há-cinco-horas-e-isso-não-é-saudável, uma afliçãozinha devia-pelo-menos-acender-a-luz-pois-anoiteceu, uma preocupação crescente tenho-fome-e-doem-me-cada-vez-mais-os-olhos. Xerazade e Xariar. Há histórias que pairam acima do mundo. Nelas a leitura é imensamente mágica, imensamente maior que a capacidade de ler e de entender o que se lê.
Não devíamos chamar clássicos a livros assim. Há muitos livros clássicos mas poucos gigantes. Há dois ou três gigantes. Quatro ou cinco gigantes. No máximo deve haver dez gigantes. Este é um deles.
posted by camponesa pragmática on 15:08
A propósito do poema de Philip Larkin, Madrugada, que a Cristina deixou durante o fim-de-semana:
1. Há vários blogs preocupados com o futuro da Íntima Fracção.
Para além do Mário Pires, do blog Retorta e da Deda, do Notícias do Cais, consegui recensear:
2. Será que a nova direcção da TSF já ouviu a Íntima Fracção?
A dúvida ocorreu-me e, francamente, instalou-se. Pelo sim pelo não resolvi gravar o próximo programa e enviar a cassete para o gabinete da direcção. Mas talvez eles precisem de muitas audições para perceberem de que falamos quando falamos da Íntima Fracção, por isso aqui fica o desafio aos ouvintes da IF: gravem a próxima emissão da Íntima Fracção e enviem-na para a TSF. Passem a palavra.
Ao longo dos dias minguantes, cinzentos, a cheirar a vento frio e a chuva, enquanto a noite conquista as 5 da tarde, regressar a este disco e ouvi-lo muitas vezes:
Olhamos tudo em silêncio na linha da praia
De olhos na noite suspensos do céu que desmaia;
Ai lua nova de Outubro, trazes as chuvas e ventos,
A alma a segredar, a boca a murmurar tormentos!
Descem de nuvens de assombro taínhas e bagres
Se as aves embalam os peixes em certos milagres;
Levita-se o corpo da alma, no choro das ladainhas,
Na reza dos condenados, nas pragas dos sitiados,
Na ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.
Livra-me da fome que me consome, deste frio;
Livra-me do mal desse animal que é este cio;
Livra-me do fado e se puderes abençoado
Leva-me a mim a voar pelo ar!
Como se houvesse um encanto, uma estranha magia,
O sol lentamente flutua nas margens do dia.
Despe o meu corpo corsário, seca-me a veia maruja,
Morde-me o peito aos ais, das brigas, dos punhais,
Da ilha dos ladrões, quem sai?
E leva este recado ao cais:
São penas, são sinais. Adeus.
Andamos nus e descalços, amantes, sedentos
Se o véu da noite se deita na curva do tempo.
Ai lua nova de Outubro,
Os medos são medos das chuvas e ventos,
Da alma a segredar, da boca a murmurar
Às vezes o improvável acontece. Quando já não esperamos?
Antes das férias encomendei uns livros à Byblos. Entre eles "Uma antologia" de poemas de Philip Larkin. É uma edição bilíngue da Fora do Texto, de 1989, difícil de encontrar. Apesar de constar da base de dados da livraria, o livro não existia.
Ontem na Biblioteca (Almeida Garrett) lembrei-me de o procurar. Porque não? E estava lá!
Philip Larkin, o poeta da tristeza e da aceitação, diz Joaquim Manuel Magalhães no posfácio.
Madrugada
Acorda-se ao som estridente
Dum galo a cantar ao longe,
Depois abrem-se as cortinas
Para ver as nuvens que voam –
E sente-se a estranheza de ter
Como elas o coração frio e sem amor.
posted by Anónimo on 17:11
cenários improváveis
Está a chover. Apetecia-me ver fotografias do Paulo Nozolino. No Edifício das Caldeiras? E daí, saltar para um café escuro e morno e beber café de saco – muito – e comer bolos de canela.