quarta-feira, dezembro 17, 2003
Há coisas difíceis de imaginar. Outras fáceis. Imagino milhões de reproduções deste quadro. Algumas excelentes. Sei que ninguém o fotografou onde é único. Sei também que este post não o mostra. Tento mostrá-lo, quase inconcebivelmente, porque a mim a memória ajuda a ver o que não está aqui e outras memórias haverá como a minha. O azul muito claro e brilhante composto, afinal, de trinta mil quatrocentas e noventa e duas tonalidades de azul muito claro, que os olhos descobrem numa sucessão de tempos mais ou menos extasiados, como, por vezes, muitas vezes, acontece nas paisagens naturais. Só que aqui é um quadro, aqui é uma incontornável criação humana. Não se pensa nisso, pelo menos eu não pensei nisso, fiquei só muito tempo a deixar as tonalidades de azul saltarem daquilo que, de início, parecia ser uma superfície quase lisa e vagamente devo ter pensado que é uma das melhores coisas que podem acontecer na vida, ser-se tomado assim por uma obra de arte, uma pessoa esquecer-se, render-se e não querer saber. Quem alguma vez se entreteve a escavar o azul cobalto, que é aquele azul que fechado parece muito escuro mas que consoante as misturas e consoante os pincéis e consoante as superfícies e consoante as luzes revela ser afinal todos os tons de azul existentes no mundo, sabe do que falo. Bem isto que eu saiba não é azul cobalto com branco, não sei o que é, mas abre a cada novo olhar, e nisso aproxima-se, só que é maior, muito maior. Nunca é igual, não é quieto, não se cala, não acaba, vive intensamente.