Do nosso correspondente em Coimbra chega-nos um pedacinho de "Uma Coisa em Forma de Assim", colecção de crónicas do Alexandre O'Neill que a Assírio & Alvim acaba de (re)editar. Gourmet, chama-lhe o Miguel. Para abrir o apetite, da crónica "Desaprender":
«Para não falar de modéstia - e afastando, desde já, qualquer vislumbre de proselitismo - eu arriscaria dizer que está condenado a si mesmo todo o escritor que não prestar mais atenção aos outros e às coisas deste mundo do que à sua - sem dúvida importante, sem dúvida decisiva - preciosa personalidade. O segredo da abelha é esse. Quem não tiver uma curiosidade encarniçada por tudo o que o rodeia, quem alguma vez supuser que dá mais do que recebe, está perdido para o tal desaprender que repõe em causa ideias e formas. É que, depois de se saber tudo, estará sempre tudo por saber. O criador deve ter a consciência de que, por melhor que crie, não consegue mais do que aproximações a uma perfeição que lhe é inatingível. Ele é um derrotado à partida. Sabê-lo e, apesar de tudo, prosseguir, é o seu único e legítimo motivo de orgulho.
O resto é bilros.»