Retrato de Isabel Rowsthorne numa rua do Soho, 1967
D.S:— Pensa que é mais difícil pintar hoje em dia do que foi antigamente?
F.B.— Penso que é mais difícil hoje porque o pintores anteriormente tiveram um duplo papel.. Estou convencido que eles pensaram que estavam a fazer relatos, e então fizeram muito mais do que recordar. Penso que hoje em dia, com os métodos mecânicos de gravação, tal como um filme e a câmara e o gravador, teve de se regredir na pintura para algo mais básico e fundamental. Porque pode ser feito melhor por outros meios que eu considero de um nível mais superficial— não estou a falar de um filme, que é cortado e refeito de todos os modos possíveis, mas estou a falar de um directo fotográfico e de um directo gravado. Penso que estes ficaram com o aspecto ilustrativo que no passado os pintores julgavam que tinham de fazer. E penso que os pintores abstractos, tendo noção disto, pensaram: porque não tirar toda a ilustração e todas as formas de relatar e apenas dar os efeitos da forma e da cor? E logicamente isto estava muito certo. Mas não resultou, porque parece que a obsessão com algo na vida que se quer recordar dá muito mais tensão e muito maior excitação do que quando apenas se continua num modo de fantasia-livre e a recordar sombras e cores. Penso que actualmente estamos numa posição muito curiosa porque, uma vez que não existe qualquer tradição, estamos perante dois objectivos extremos. Existe a reportagem directa como algo que está muito próximo de um relatório policial. E então a única finalidade é fazer grande arte. E o que é considerado a meio caminho, a arte realista, num tempo como o nosso não existe. O que não significa que, no desejo de fazer grande arte, não haja quem a pratique. Mas pode dizer-se que é esse o factor que cria uma situação extraordinária. Porque, com estes maravilhosos meios de gravar factos, o que apenas se pode fazer é caminhar para uma coisa muito mais extrema, na qual se está a relatar o facto, não apenas como simples facto, mas a muitos níveis, que abrem áreas de sensação que lidam com um sentido mais profundo da realidade da imagem a que se quer chegar e por meio da qual essa coisa será captada em bruto e viva e deixada aí e, finalmente fossilizada, poder-se-á então dizer— aqui está.
in David Sykvester, Interviews with Francis Bacon (1975).