«(Uma) das séries mais fascinantes da autora: Strip. Nesta série de fotografias a artista faz-se fotografar enquanto faz um strip-tease perante convidados masculinos. A autora despe-se diante de cada um deles e é a cada um deles que compete escolher o momento do registo fotográfico mas, na imagem final, a artista é vista de costas e são eles que surgem retratados de frente.
A aparente submissão a uma das mais comuns fantasias associadas ao olhar masculino objectificador da mulher transforma-se, assim, numa subordinação desse olhar masculino ao poder de uma encenação feminina que, ao gratificá-lo de modo excessivo, acaba por o esvaziar de poder colocando-o, afinal, na posição de objecto da nossa curiosidade malsã. O que atrai o nosso voyeurismo nestas fotografias não é o modo como a artista se despe mas o modo como os seus colaboradores masculinos "aguentam" a situação.
O facto de os colaboradores convidados serem, todos eles, homens com funções e nomes consagrados no mundo da arte (crítico, dealer, escritor, curator) vem trazer a esta operação estético-sexual uma nova dimensão de implicações, no âmbito de uma sociologia da arte que tenha consciência da indissociabilidade entre significações artísticas e significações culturais, contextuais, construídas no âmbito das lógicas de interacção social no interior do mundo da arte. Entre a economia do desejo e a sociologia da arte, entre a economia da arte e a sociologia do desejo, onde é que está o meu corpo?»
Alexandre Melo, "Onde é que está o meu corpo", Catálogo da Exposição de Jemima Stehli no Centro de Artes Visuais, distribuído com o Jornal Público, no dia 1 de Março