domingo, fevereiro 01, 2004
tabletezinhas de chocolate
Porém, é uma irresponsabilidade da minha parte ser assim tão esquecido. Uma vez, num pálido parque de Novembro, depois de ter feito, de passagem, uma visita a uma tipografia e de ter tagarelado durante quase uma hora com o seu proprietário, o salteador deparou com a dama pintada por Henri Rousseau, vestida de castanho dos pés à cabeça. Estacou, pasmado, diante dela. Veio-lhe então à mente que, anos atrás, no decurso de uma viagem de comboio, a meio da noite, a uma mulher que com ele viajava, havia declarado, à velocidade de um comboio rápido, por assim dizer: «Vou para Milão.» E veio-lhe, também, sobremaneira, como num relâmpago, a lembrança das pequenas tabletes de chocolate que se compram nas mercearias. Os miúdos adoram-nas e o senhor salteador ainda as comia de bom grado, de vez em quando, como se o gosto de comer tabletezinhas de chocolate e outras coisas do género fosse inerente à condição de salteador.
Robert Walser, O Salteador (páginas 15 e 16), tradução de Leopoldina Almeida, edição da Relógio d'Água
posted by Anónimo on 21:38