Chove mansamente. O saibro esboroa-se sob os pés. No início da subida uma gralha-de-bico-vermelho denuncia-nos com estridência. À nossa frente o enorme paredão granítico.
Uma vez mais testemunhamos a tortura universal dos azevinhos. Os carvalhos de fevereiro são cruzes alucinadas. Subimos em silêncio dos 400 aos 900 metros. Temos pelas costas um arco íris. Pisamos agora os tojais, a torga e o zimbro. Faz cada vez mais frio e começa a nevar, sem ameaça. Estranhamente, mais guiadas pela temperatura interior, as mulheres começam a despir-se
Estação segunda: Curral da Carvalha das Éguas
Caminhamos no planalto com as serras geladas de Espanha à vista, a menstruação escorrendo na neve e, à chegada ao curral, abrem-se as patas das éguas como magnólias pretas.
Estação terceira: Curral da Espinheira
Gelaram as mãos para a ternura e gelaram literalmente. Cantamos eufóricos e depois dançamos na clareira onde perpassa a memória dos celtas. Um tor granítico alinha-se como uma biblioteca onde todos os autores fossem clássicos. Na descida para a Pedra Bela alguém andou a fazer uma tosquia demencial ao pinheiro-negral.
Descida para o Gerês
Já dissemos quase tudo uns aos outros. Descemos aos pares, silenciosos. Somos como o musgo espesso, as trepadeiras no tronco dos carvalhos, os fungos lamelares nas bétulas. O sangue reflui aos vasos periféricos e dói-nos a reperfusão. Mas estamos em paz, momentaneamente poupados da maldição que atinge os carnívoros.
(Volto para a casa das meninas, hoje alegrada pelos okupas. Vou ficar sentado num cantinho. Alguém me arranja uma manta?)