A Janela Iluminada (um capítulo da Educação Sentimental)
A luz na janela era o sinal. Ela excluía os dias férteis, quase todos os fins de semana, as quintas feiras, reservadas às amigas, o final de cada período escolar e todos os dias em que ele não dava aulas na Universidade de A. Eu passava, via a janela apagada e continuava o caminho, sem hesitações. Às vezes encontrava um exibicionista com a sua gabardina e uma fogueira. Outras vezes ninguém.
Nos dias da janela iluminada podia subir. Ela nunca disse amor, amo-te, meu amor, essas coisas. Ao princípio, se surpreendia o meu espanto, mandava-me fechar os olhos. Eu que me guiava pela pulsação carmim : escarlate da cara dela, passei a concentrar-me nos círculos concêntricos da respiração.
Nem tudo pode correr bem todo o tempo, e é este o aviso que vos quero dar. Sabia que devia estar atento à janela iluminada, à flutuação da estação, à neblina da rua no bairro afluente, ao modo como o cão me acolhia quando saltava a sebe do jardim, à porta da garagem. Mas é ilusório supor que se controlam as múltiplas variáveis do amor, mesmo se as palavras se não se dizem e os gestos são só os gestos consentidos. Um dia, os estudantes da Universidade de A. fizeram greve sem pré-aviso e este tipo de greves causa sempre vítimas inocentes.
posted by Anónimo on 00:04