Godard: Há uma expressão que se deixou de usar, mas que se usava antigamente: pintura dos sentimentos. É isso o que você faz.
Bresson: Pintura— ou escrita, para o caso é a mesma coisa, é creio eu, uma pintura.
(Entrevista publicada nos Cahiers du Cinema, nº 178, Maio, 1966).
—Foi pintor antes de ser cineasta?
—Quer dizer, sou pintor. Não se pode ter sido um pintor e deixar de o ser.
—De que pintores se sente mais próximo, agora?
—De todos os que não seguiram ou não seguem uma moda. Julgo que gosto de todos os grandes pintores. Não tenho preferências. Gosto da pintura-pintura. A pintura abstracta é muitas vezes demasiado decorativa. E não conheço nada de mais abstracto que Vermeer.
Toda a pintura (como todo o filme) é forçosamente abstracta.
(Entrevista de Outubro de 1962, publicada no nº 140, Fevereiro de 63, dos Cahiers du Cinema)
A pintura ensinou-me que o que havia a fazer não eram imagens belas mas imagens necessárias. Plasticamente, é preciso esculpir a ideia num rosto através da luz e da sobmra.
(Entrevista de Maio de 1962, publicada no n.º 928 de Les Lettres Françaises).
Godard—Há duas tendências em si (e Não sei qual delas lhe corresponde melhor). Você é, por um lado, um humanista, por outro lado, um inquisidor. Acha que isso é conciliável, ou...?
Bresson—Inquisidor? Em que sentido? Espero que não...
Godard—Com certeza que não no sentido Gestapo. Mas num sentido, digamos...
Bresson—Não no sentido da Inquisição? São Domingos?
Com certeza. Mas, apesar de tudo...
Bresson— Não! Não!
Godard—Então, digamos, jansenista
Bresson— Jansenista no sentido do despojamento.
Godard—Sim, mas além disso, há outra coisa, e a palavra inquisidor...
Bresson—Inquisidor, inquisidor..Não quer dizer que eu imponho a minha maneira de ver as coisas. É verdade que impono—e nem pode ser de outra maneira— a minha maneira de ver, de pensar, a minha opinião pessoal, mas como toda a gente escreve...
Quer dizer, se há Inquisidor, direi então que vou procurar nas pessoas o que elas têm de mais requintado, de mais pessoal.
Godard—Sim, mas ao mesmo tempo há um lado terrível...
Bresson—Refere-se à Pergunta?
Godard—Sim. À Pergunta.
Bresson— Está bem, evidentemente, a Pergunta eu faço-a.
Godard—Pois.
Bresson— A Pergunta que provocará a resposta. Mas vivemos todos as fazer perguntas a que talvez demos respostas ou para as quais esperamos respostas. É certo que o meu modo de trabalho é um questionário. Mas é um questionário no desconhecido, ou seja, dêem-me alguma coisa que me surpreenda (...)
Delahaye—O Acaso?
Bresson— Sim, o acaso. Por aí vamos ao jansenismo, pois eu acredito realmente que a nossa vida é feita de predestinação e de acasos...
(Entevista nos Cahiers, n.178).
in Catálogo do Ciclo Robert Bresson Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Abril de 1978