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Janela Indiscreta
 
terça-feira, setembro 16, 2003  
Hoje não tenho nada para fazer. O trabalho abrandou e, para passar o tempo, resolvi copiar o Rui Amaral. Fui ao Brasil. Por é quase Primavera.
Descobri que também gostava que existisse uma "máquina de exterminar chatos" e não me importava de cuspir bolinhas de ténis. Ver protótipo aqui em baixo à esquerda:



E que dizer deste livro? (colocado à direita, sem qualquer intenção, asseguro) Em meados de 1947, John Steinbeck e Robert Capa foram à União Soviética. Um escreveu e o outro fotografou. Ora leiam a apresentação de Um diário russo , feita pelo fotógrafo.

Tentei cortar o texto mas o Capa tem tanto humor (as descrições do triplo Steinbek e do sisudo Tchmarski são brilhantes) que não ousei. Quem não achar piada pode seguir até ao próximo post.

Não estou nada satisfeito. Dez anos atrás, quando comecei a ganhar a vida fazendo fotos de pessoas sendo bombardeadas por aviões decorados com pequenas suásticas, vi alguns aviõezinhos com estrelinhas vermelhas abatendo os que tinham suásticas. Isso aconteceu em Madri, durante a Guerra Civil, e foi algo que me deixou muito contente. Decidi então que gostaria de conhecer o lugar de onde vinham aqueles aviões de bicos trombudos e seus pilotos. Queria visitar e fotografar a União Soviética. Na época, encaminhei a primeira solicitação nesse sentido. Durante os últimos dez anos, meus amigos russos muitas vezes se revelaram irritantes e intoleráveis, porém, quando o tiroteio ficou sério, eles de algum modo acabaram no lado onde eu estava me esfalfando, o que me permitiu atormentá-los com minhas solicitações. Mas elas nunca tiveram resposta.
Na primavera passada, os russos conseguiram se tornar espetacularmente impopulares na minha seara, e houve um empenho considerável para que dessa vez disparássemos uns contra os outros. Como os discos voadores e a bomba atômica não são lá muito fotogênicos, decidi fazer mais uma solicitação, antes que fosse tarde demais. Dessa vez, encontrei apoio da parte de um sujeito de vasta reputação, sede insaciável e uma delicada simpatia pelos oprimidos. Seu nome é John Steinbeck, e seus preparativos para a viagem foram muito peculiares. Primeiro, disse aos russos que era um grande equívoco vê-lo como um dos pilares do proletariado mundial, pois na realidade poderia ser mais bem descrito como um legítimo representante da decadência ocidental, tão ocidental quanto os botequins mais decadentes da Califórnia. Também se comprometeu a escrever apenas a verdade, e quando educadamente perguntaram-lhe que verdade era essa, ele respondeu: "Não faço a menor idéia". E, após esse começo promissor, ele pulou de uma janela e quebrou o joelho.
Isso aconteceu meses atrás. Agora estou aqui no meio da madrugada, sentado em um lúgubre quarto de hotel, circundado por cento e noventa milhões de russos, quatro câmeras, dúzias de filmes expostos e muitos outros, mais ainda virgens, e por um Steinbeck adormecido, e não estou nada feliz. Os cento e noventa milhões de russos estão contra mim. Não estão promovendo acaloradas reuniões pelas esquinas, nem praticando o amor livre de modo espetacular, tampouco exibem qualquer tipo de moda revolucionária; na verdade, esse é um povo muito consciencioso, recatado e trabalhador, e, para um fotógrafo, tão enfadonho quanto uma torta de maçã. Além disso, parecem apreciar o modo de vida russo e não gostam nem um pouco de ser fotografados. Minhas quatro câmeras, acostumadas a guerras e revoluções, estão enfastiadas, e toda vez que as uso algo sai errado. Além disso, tenho de lidar com três Steinbeck, e não apenas um.
Meus dias são longos e começam com o Steinbeck matinal. Ao acordar, abro os olhos com todo o cuidado, e o encontro sentado à mesa. Diante de um grande caderno, ele finge que trabalha. Na realidade, está apenas esperando, atento aos meus menores movimentos. Ele está desmaiando de fome. Mas o Steinbeck matinal é um indivíduo muito tímido, absolutamente incapaz de usar o telefone e empreender a menor tentativa de articular uma conversa com garçonetes russas. Portanto, chega uma hora em que desisto, levanto da cama, agarro o telefone e peço o café da manhã em inglês, francês e russo. Isso o reanima a tal ponto que se torna arrogante. Seu rosto assume a expressão de um filósofo de aldeia bem pago, e ele diz: "Tenho algumas questões para você esta manhã". Evidentemente, ele passara três horas esfomeado preparando as malditas questões, que iam desde os hábitos à mesa dos antigos gregos até a vida sexual dos peixes. Eu me comporto como um bom americano e, ainda que pudesse responder a suas perguntas de maneira simples e clara, recorro aos meus direitos civis, recuso-me a esclarecê-lo, e deixo que a coisa seja enviada à Suprema Corte. Mas ele não desiste com facilidade, fica se vangloriando de seus conhecimentos universais, tenta me provocar com dicas e simpatia, e tudo isso me força ao exílio. Busco refúgio no banheiro, um lugar que simplesmente detesto, e me forço a permanecer na banheira revestida de lixa e cheia de água fria até a chegada do café da manhã. Às vezes isso leva um tempo considerável. Depois do café, consigo ajuda, pois Tchmarski chega. Não há fases matutinas e vespertinas no caráter de Tchmarski, ele é terrível o tempo todo.
Durante o dia, tenho de lutar contra cento e noventa milhões de leões que se recusam a ser fotografados, ao lado do senhor Tchmarski, que ignora a fotografia, e do Steinbeck matinal, que é tão perfeitamente ingênuo que todas as perguntas que lhe são dirigidas pela população russa curiosa e fascinada por seus heróis são respondidas com um amistoso resmungo, "sobre isso, não tenho a menor idéia". Depois dessa tremenda declaração, ele fica totalmente exaurido, fecha-se como uma ostra, e grandes gotas de transpiração escorrem por seu avantajado rosto de Cyrano. Em vez de fazer minhas fotos, sou obrigado a traduzir o estranho silêncio do senhor Steinbeck em sentenças inteligentes e evasivas, e aos trancos e barrancos seguimos nessa toada até o final do dia, quando nos livramos de Tchmarski e retornamos ao hotel.
Após um breve striptease mental, aparece o Steinbeck noturno. Esse novo personagem é perfeitamente capaz de erguer o telefone e pronunciar palavras como "vodca" e "cerveja", compreensíveis pelo garçom mais estúpido. Depois de ingerida certa quantidade desses líquidos, ele se torna articulado, fluente e expõe suas inúmeras e irretorquíveis opiniões sobre tudo e todos. Isso continua até encontrarmos alguns americanos que possuem esposas aceitáveis, cigarros e bebidas nativas, e mesmo assim não fogem de nós. Nessa altura, Steinbeck poderia ser descrito como um personagem bastante alegrinho. Se há uma mulher bonita numa festa, ele sempre se mostra disposto a me proteger, colocando-se entre mim e ela. Essa é a hora em que recuperou sua capacidade de conversar, e se eu tento salvar a inocente moça convidando-a para dançar, nenhuma perna quebrada o impedirá de se intrometer quase que no instante seguinte.
Depois da meia-noite, sua inocência adquire um vigor extraordinário. Ele prova isso com um único dedo. Começa perguntando aos inadvertidos maridos se conhecem o jogo do dedo. Então os dois cavalheiros sentam-se a uma mesa, um defronte ao outro, apóiam firmemente seus cotovelos na toalha e enlaçam seus dedos médios. Após certo esforço, o senhor Steinbeck em geral consegue empurrar a mão do marido até que ela toque na mesa, e logo se desculpa profusamente. Às vezes, noite já avançada, ele propõe esse jogo a seja quem for. Certa vez, até mesmo a um cavalheiro russo que todos, menos ele, estavam vendo que deveria ser um general.
Depois de um esforço de gentil convencimento e de uma longa dissertação sobre a dignidade, voltamos para o quarto. Agora já são mais de três da madrugada. Esta noite Steinbeck se metamorfoseou em sua personalidade madrugadora. Está deitado, agarrando com firmeza um grosso volume de poemas escritos há dois milênios, intitulado O cavaleiro em pele de tigre. Seu rosto está totalmente relaxado, a boca aberta e, emitindo ruídos graves e baixos, o homem ronca sem o menor constrangimento ou inibição.
Ainda bem que consegui emprestado um romance policial de Ed Gilmore, exatamente porque sabia que não conseguiria dormir e teria de ler até o amanhecer.
Bem, agora vou deixá-los, gentis leitores americanos, e faço questão de assegurar aos gentis leitores russos que tudo o que o senhor Tchmarski escrever sobre nós no Pravda é a mais absoluta verdade.



posted by Anónimo on 12:17


 
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