Vai o ouvinte embalado pela voz e pelos sons de António Cartaxo para as 10 da manhã e nem quer acreditar nas horas que um "mixing" surpreendente e agressivo lhe anuncia. Mudança automática de frequência, pensa, aborrecido. O anúncio de estação logo a seguir mostra-lhe que não há engano. Aquilo é mesmo a Antena 1. O que acabou foi o sinal horário.
Assim de repente, sem aviso prévio, deitou-se borda fora um património sonoro que acompanhou três gerações de ouvintes de rádio. Mais do que o logótipo, mais até do que a sigla - ambos com menos de trinta anos e infelizmente de uma triste banalidade - , muito mais do que os indicativos com que cada novo director parece querer ganhar o seu lugar na eternidade radiofónica, o sinal que até ontem nos anunciava a hora certa na RDP (antes, na Emissora Nacional) era a imagem de marca, o referencial estético sonoro do serviço público de Radiodifusão.
Tão diferente era de todos os outros quanto esta síntese amalgamada de nervosos "pis" se confunde agora com a de todas as outras estações do espectro radiofónico.
Sim, aquele era - sustentei neste mesmo jornal há nove anos quando outros decisores o calaram, felizmente por pouco tempo - o mais belo sinal horário do mundo. Ouvi-lo, assim solene e límpido, era regressar à magia dos dias do sanfilismo. Os burocratas que o suprimiram não devem nunca ter amado a Rádio, concluía então.
Julgo que seria injusto repeti-lo neste momento. As mudanças a que temos assistido nos últimos meses na Antena 1 são no geral positivas. Em particular as novidades que nos foram oferecidas ontem no programa da manhã deste canal. Razão suplementar para que não se aceite sem um protesto público esta substituição. Que afecta, aliás, todos os canais, nacionais e internacionais, da RDP.
Argumentarão os responsáveis com a excessiva duração do "velho" sinal horário. Por isso lhe cortaram 15 dos 20 segundos que demorava no "ar". Como se deles necessitassem para algum anúncio a algum sabonete. Mostrando que não entenderam que aqueles momentos sem palavra antes da hora eram, num tempo de frenesim e caos informativo, a pausa de reflexão, o sereno respirar fundo que nos prepara para a entrada numa outra hora do resto das nossas vidas..
posted by Anónimo on 10:04