O roteiro de “Persona” não se assemelha àquilo que costumamos designar por roteiro.
Quando se escreve um roteiro também se leva em conta as dificuldades técnicas. A bem dizer, é uma partitura que se escreve. Depois é só questão de colocar as vozes diante do atril e deixar a orquestra tocar.
Não sou pessoa para chegar ao estúdio ou ao lugar onde se realiza a filmagem e me convencer de que “este negócio vou solucionar de uma maneira ou de outra”. Para mim não é possível trabalhar a partir de uma improvisação. Eu só me atrevo a improvisar se sei que posso apoiar-me num plano meticulosamente traçado. Não sou capaz de confiar na inspiração quando me encontro no local de filmagem.
Quando lemos o texto de “Persona”, talvez dê a impressão de ser uma improvisação. Mas não. Esse texto foi rigorosamente concebido. Apesar disso, nunca repeti tantas cenas em minha vida como nesse filme. E quando digo que repeti cenas, não quero dizer filmagens de uma e mesma cena, no mesmo dia, mas sim novas filmagens por não ter ficado satisfeito com as sequências reveladas de cada dia.
A filmagem de “Persona” começou em Estocolmo e, no princípio, não correu nada bem.
Depois, pouco a pouco, pudemos dizer: isto vamos fazer melhor, aquilo podemos arranjar de outro modo, e assim por diante. Ninguém se irritou. E ganha-se muito quando ninguém começa a dizendo: foi culpa minha. Além de o filme ter ganho bastante com o facto de se terem manifestado sentimentos pessoais durante a filmagem, a qual se pode classificar de filmagem feliz. Apesar do cansaço que sentia, experimentei uma liberdade ilimitada com a câmara e com a equipa técnica.
Com este filme, “Persona”, e, mais tarde com “Lágrimas e suspiros”, fui o mais longe que pude quanto à técnica narrativa. Isto é, com total liberdade toco em segredos para os quais não existem palavras e que só a cinematografia pode patentear.