O Umbigo Niilista acha que “uma citação pode ter propriedade mesmo sem o conhecimento literal da obra citada” e que “quando é só pose e vacuidade, dificilmente se consegue ir além disso, por mais e melhores citações empregues”, isto para discordar um pouco do Aviz que, por sua vez, concordava com as Crónicas Matinais, onde se lê «Agora todos, ou quase todos, citam muito. Compram as muitas e boas enciclopédias que há e o conhecimento fica por elas formatado. Citam muito, conhecem os nomes dos pensadores, analistas, comentadores, filósofos, etc. Citam a torto e a direito mas, pergunto eu, terão realmente lido as obras ? analizado as ideias? pensado em vez de decorado? [...] Por cada citação que leio de Horácio, Virgílio, Dante, Milton, Shakespeare ou Camões eu tremo. Tremo porque temo que a citação tenha sido fruto de uma pesquisa "googoleana" , enciclopédica, para inglês ver. E isso faz de mim, actualmente, uma fundamentalista!»
O Rain Song tem um texto intitulado “Cite-me, por favor!”, a propósito da página d’O Citador. Há muito devia ao Paulo Silva uma nota sobre a sua página. O José Manuel adiantou-se-me e bem, já que a minha falta de tempo aliada à indolência me impediriam de o fazer durante longos meses. Perante esta convergência de textos sobre citações tive hoje de fazer um esforço. Subscrevo o que se diz no Rain Song sobre O Citador. Com uma reserva de pedra quanto a citações nietzscheanas - por se tratar de um mundo único com um dicionário próprio, reunido de forma dispersa pelos seus muitos livros, citar Nietzsche na melhor das hipóteses é inútil e na pior das hipóteses é deturpador, perigoso e leviano. Só um parágrafo de Nietzsche dá acesso exacto e inteligível aos significados do parágrafo seguinte. Só um livro de Nietzsche dá acesso ao livro seguinte.
Talvez a impossibilidade de citação isolada de Nietzsche, sendo, como é, manifesta, revele a subtil impossibilidade de citação de qualquer autor. Mas a página do Paulo Silva, apesar de todas as reticências que eu tinha contra as citações, e que lhe dei a conhecer, obriga-me a dar o braço a torcer. O Paulo é um leitor sério, um devorador, anotador, analisador, pensador de livros. E não se fica pelos gurus de cada autor. Quando um autor lhe interessa, o Paulo reúne, lê e anota os livros que pode. Ninguém lê à toa e o holy grail livresco do Paulo é aquele que eu mais admiro – a muito humana faculdade de pensar. Afinal, e ao contrário do que eu era levada a crer pelos meus preconceitos, shame on me!, é possível cumular as seguintes características: ler e pensar livros, ser inteligente e disciplinado, gostar de citações. E venham más-línguas dizer que o Paulo é a excepção que confirma a regra - se a excepção é tão inspiradora, quem quer saber da regra?
posted by camponesa pragmática on 12:58