"Millhouse" é um documentário de contornos inesperados. O autor, Emile De Antonio, é um dos nomes malditos do cinema americano. Artista radical com ligações a Warhol, Johns, Stella e Rauschenberg, De, como ficou conhecido pelas pessoas do meio, começou por atrair a atenção das autoridades americanas com "Point of Order", de 1963.
Aí, trabalhando com material de arquivo respeitante aos interrogatórios do senador Mcarthy, produziu um violento libelo contra a caça às bruxas e, a partir de então, ficou sob a vigilância do FBI.
Os filmes que se seguiram, nomeadamente "In the Year of the Pig", de 1969, um ensaio sobre a guerra do Vietname, ajudaram a consolidar a sua reputação de cineasta radical. Mas foi com "Millhouse", de 1971, que Emile De Antonio, fez o pleno da contestação por parte da América conservadora. O objecto do filme é o ex-presidente dos Estados Unidos, Richard Milhous Nixon. Trabalhando, uma vez mais, sobre materiais de arquivo, muitos deles obtidos, aliás, de forma rocambolesca para escapar à vigilância policial, o realizador optou por um registo satírico que faz de "Millhouse" um dos raros documentários políticos estruturados em termos de comédia.
Daí também, a sua eficácia e o sucesso que então obteve. Emile De António negou sempre qualquer espécie de reserva pessoal para com Richard Nixon, argumentando que o que estava em causa era, fundamentalmente, o sistema político americano. Mas, a verdade é que "Millhouse", pelo retrato que faz do carácter de Nixon, foi um filme premonitório: o mundo saberia do escândalo de Watergate dois anos mais tarde.