Quem viu o filme "Hable con Ella" de Pedro Almodóvar, certamente não esqueceu as primeiras e as últimas cenas do filme. Nas primeiras, vê-se um pequeno fragmento da peça-bailado, "Café Müller", da coreógrafa alemã, Pina Bausch. E nas últimas, a peça-bailado, "Masurca Fogo" da mesma coreógrafa. São duas peças que abrem e fecham o círculo da história do filme.
Em "Café Müller", o corpo escreve o lado "catastrófico" da vida. Nesta peça, Pina Bausch (que aparece dançando, de olhos fechados,sem um ponto fixo, desarticulada) coreograficamente encena o que resta do lado "catastrófico" da vida, que é a incomunicabilidade, a desarticulação entre as pessoas. A desarticulação também se dá no próprio corpo, pelos movimentos bruscos e pelos movimentos inconsequentes. Aqui, os bailarinos-actores não têm um sentido, um projecto, um destino. É um movimento absurdo. É a vida, no seu lado "catastrófico".
"Masurca Fogo"
Aquando da sua passagem por Lisboa, pra apresentar o espectáculo "Água", uma coreografia que presta homenagem ao Brasil, onde debaixo do som de Tom Waits, P.J. Harvey, Tom Jobim, entre outros, são desfiladas imagens que Pina Bausch "comeu" nos lugares de Brasil (São Paulo, Rio e Baía), a coreógrafa alemã lá respondeu algumas perguntas (coisa de que ela não gosta. não gosta de explicar a sua obra) pra a imprensa.
Uma das perguntas foi esta:
"Existe uma dança que é mais feliz que outra?"
"Não sei responder se há uma dança mais feliz que outra. O que é maravilhoso na dança é que é sempre "no momento" e não existe mais nenhum momento quando se está naquele. Na dança não há ontem nem amanhã, só há dança. É fabulosa, é sempre única, não se pode repetir. Nunca se sabe o que poderá ser reconstituído de uma apresentação de dança. Extraordinário é o teatro, o público, as pessoas sobre o palco, a música, mas é tudo único de cada vez."
Outra:
"O que é que procura num bailarino?"
"É muito complicado de dizer. (...) Em primeiro lugar, têm de ter necessidade de falar de si próprios, de dizer o quanto amam as pessoas. Têm de sentir de uma forma genuína- não sentir aquilo que pedimos que sintam. Têm de querer falar, mesmo que não o saibam ainda. Talvez a maioria descubra essa urgência de comunicar, enquanto trabalhamos, enquanto experimentamos."