Hoje, ao fim da manhã, passou, na antena 2, um programa dedicado ao poeta Ruy Belo, visto que é o 70.º aniversário do nascimento do poeta. De qualquer modo, perdi-o.
Por trás do nome Ruy Belo, surge-me uma maré de palavras. mar. terra. árvores. searas. praia. cafés. amigos. silêncio de Deus. ruas compridas. bilhetes de comboios dentro de livros. tempo detergente. igrejas e procissões. a sombra da morte. o transporte no tempo. povo. aquele grande rio. passeios. lugares. fazer habitar. tenho mesmo que cortar o fio aqui, porque se deixo cair as palavras continuamente, a janela perde as margens.
Porém, não se pode colocar à margem a poesia do Homem das Palavras.
A Multipicação do Cedro
O senhor deus é espectador desse homem
Encheu-lhe o regaço de dias e soprou-lhe
nos olhos o tempo suave das árvores
Deu-lhe e tirou-lhe uma por uma
cada uma das quatro estações
A primavera veio e ele árvore singular
à beira do tempo plantada
vestiu-se de palavras
E foi a folha verde que deus passou
pela terra desolada e ressequida
Quando as palavras o deixaram de cobrir
ficaram-lhe dois dos olhos por onde
o senhor olha finitamente a sua obra
Até que as chuvas lhe molharam os olhos
e deles saíram os rios que foram desaguar
ao grande mar do princípio
Aquele Grande Rio Eufrates
Minor White, Seascape
"Mesmo que não conheças nem o mês nem o lugar
caminha para o mar pelo verão "